quarta-feira, 28 de setembro de 2016

A casa da Mãe Joana


Rotatividade delituosa

A Casa Civil é o mais importante gabinete da Esplanada dos Ministérios, o mais próximo da Presidência, aquele que tem o maior espectro de atribuições político-administrativo no assessoramento direto de quem ocupa a chefia da República.

O titular é a pessoa que avalia e monitora atos presidenciais – aqui incluído o exame prévio da constitucionalidade de cada um deles –, acompanha a execução de ações governamentais da Presidência e demais ministérios, supervisiona o andamento das propostas do Executivo no Congresso, passa o pente-fino em cada palavra a ser publicada no Diário Oficial, analisa o mérito dos projetos, fiscaliza o andamento das propostas, faz a interface com o Parlamento, toca, enfim, a República.

Explicito isso para que o prezado leitor e a cara leitora tenham a exata noção do que significa o posto ocupado nos governos dos variados partidos e do PT por nove titulares. Daí talvez lhes facilitem a compreensão sobre a gravidade de cinco deles serem acusados, condenados ou investigados por corrupção.

O primeiro e mais poderoso, José Dirceu, cumpriu pena em decorrência do processo do mensalão e foi preso outra vez por decisão do juiz responsável pelo caso do petrolão. Certamente sofrerá novas condenações. Dirceu é aquele cujo braço direito nos primórdios do governo de Luiz Inácio da Silva, Waldomiro Diniz, foi pego pela exibição de um vídeo em que tentava extorquir o bicheiro, dito empresário, Carlos Cachoeira.

Um tempo risonho. Franco e de alguma forma até ingênuo a julgar o que viria depois. Dirceu sucumbiu ao escrutínio do Supremo Tribunal Federal e antes sofreu a cassação do mandato na Câmara numa situação muito semelhante à de Eduardo Cunha, sendo um todo-poderoso que não resistiu aos fatos. Isso numa época em que a votação para esses casos era secreta.

Deu-se um trauma no governo Lula que, para superá-lo, nomeou Dilma Rousseff, a ministra de Minas e Energia de então, para o posto. Já na ideia de construção da candidatura de uma “mulher honesta” que viria a parecer tudo menos honesta. Elegeu-se presidente e no mandato subsequente sofreu o segundo impeachment em menos de 25 anos da história brasileira.

Em seguida a Dilma, ocupou a Casa Civil Erenice Guerra, até então o chamado braço direito dela. Não durou no cargo, do qual precisou abrir mão quando das evidências de prática de influência dela e da família no governo. Erenice hoje está na mira de Curitiba.

Por breve período de dois meses durante a campanha eleitoral de 2010, Carlos Eduardo Esteves foi o chefe da Casa Civil enquanto Dilma cuidava da própria campanha da qual, uma vez eleita, nomeou Antonio Palocci para a Casa Civil. Isso a despeito de o personagem já ter tido várias denúncias, dentre as quais as do recebimento de propinas por causa de um repentino aumento de patrimônio e de ter, por isso, perdido o cargo de ministro da Fazenda.

Hoje Palocci está preso, sob a acusação de extorquir R$ 128 milhões da empreiteira Odebrecht. Sua sucessora, Gleisi Hoffmann, encontra-se nas malhas da Lava Jato por obra do caixa 2 da Petrobrás do qual, segundo os investigadores, teria recebido R$ 1 milhão resultante de propinas acertadas por ocasião de contratos firmados pelo governo com a Petrobrás.

Depois de Gleisi foram nomeados Aloizio Mercadante, Jaques Wagner e Eva Chiavon (militante do MST), descontada a fracassada tentativa de acolitar Lula na Casa Civil para protegê-lo da ação do juiz Sérgio Moro. Não se protegeu nem impediu abertura de procedimento por obstrução de Justiça.

De onde é de se concluir que a Casa Civil foi tratada nos anos do PT no poder como a casa da mãe Joana.
       
Dora Kramer, O Estado de São Paulo, 28 Setembro 2016

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

A prova do crime


O maior indício de que Luiz Inácio Lula da Silva cometeu os crimes que lhe são imputados está justamente em sua defesa: ao bradarem que o chefão petista é “perseguido político”, os advogados e os áulicos de Lula deixam claro que não têm como justificar as evidências de que o ex-presidente participou – como “comandante máximo”, “grande general” e “maestro”, segundo o Ministério Público Federal – do maior esquema de corrupção da história brasileira.

Talvez influenciado pelo estilo bravateiro do seu cliente, um dos advogados do capo disse que “o crime de Lula, para a Lava Jato, é ter sido presidente eleito democraticamente duas vezes”. Com isso, a defesa do ex-presidente confirma sua estratégia de insultar a Justiça e transformar Lula em vítima de um grande complô das “elites”.

Lula, pessoalmente, não se furta a desempenhar o patético papel de vítima: vai à televisão, conta detalhes de sua sofrida vida – até se tornar o nababo de hoje –, descreve a fome e chora copiosamente. Explicações sobre as acusações que sobre ele pesam não dá nenhuma, até porque não existem.

Nessa estratégia, pouco importa o que Lula fez. Acreditando-se acima da lei, o ex-presidente considera que o País lhe deve eterna gratidão por ter sido o responsável, segundo alardeia, pela felicidade de milhões de pobres. Quem quer que se empenhe em fazer Lula responder por seus atos é desde logo identificado como integrante da tal conspiração – que, conforme o PT, envolve a imprensa independente, os empresários, o Congresso e o Judiciário, inclusive o Supremo Tribunal Federal.

Há tempos a Justiça vem recolhendo evidências de que Lula, enquanto espezinhava as tais “elites”, constituiu para si uma outra elite de estimação e luxo – formada por empresários e políticos que aderiram ao monumental esquema de corrupção que os petistas instalaram no governo federal. Tal organização passou os últimos dez anos a operar uma formidável máquina de financiamento de um projeto criminoso de poder e enriquecimento. O mensalão foi apenas um fotograma desse grotesco filme de terror.

Em quase 150 páginas, os procuradores da Lava Jato afirmam ser capazes de demonstrar que Lula se beneficiou pessoalmente desse esquema. Ele teria recebido R$ 3,7 milhões em propinas da construtora OAS, empreiteira responsável pelo famoso triplex de que a família Da Silva pretendia usufruir. Para se defender, Lula mandou dizer que “jamais foi proprietário” daquele apartamento. Em primeiro lugar, é improvável que apareça algum documento em que conste o nome de Lula como proprietário do tal triplex, porque se trata, conforme a denúncia, de uma operação de lavagem de dinheiro, em que o nome do verdadeiro dono nunca aparece. Em segundo lugar, Lula não precisaria ter dormido no triplex para que ficasse comprovado o elo entre o imóvel e o esquema que o beneficiou, assim como não foi necessário flagrar Fernando Collor dirigindo o Fiat Elba que selou sua sorte na Presidência, em 1992.

É claro que, para Lula, não interessa responder ao que está nos autos, pois parece óbvio que ele não tem uma boa resposta a dar. Sua reação é a de sempre: passar-se por vítima.

Enquanto isso, a denúncia do Ministério Público contra Lula será analisada pelo juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato. Era isso o que Lula mais temia, e não sem razão. Ontem, Moro condenou a 9 anos e 10 meses de prisão o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do peito de Lula, em razão da intermediação de um empréstimo fraudulento do Grupo Schahin para o PT, em troca do qual aquela empresa ganhou um contrato bilionário com a Petrobrás. No mesmo caso foi condenado a 6 anos e 8 meses de prisão o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto.


A cada sentença como essa fica mais clara a dimensão da organização criminosa petista, que, como já disse o procurador-geral, Rodrigo Janot, e reafirmou agora a força-tarefa da Lava Jato, não poderia ter funcionado por tanto tempo e de maneira tão agressiva sem que Lula dela participasse.

O Estado de São Paulo - 16/9/2016

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

O desfecho do impeachment


Todo cidadão honesto deste país há de estar estupefato com o desfecho do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Malgrado o fato de que a petista finalmente teve seu mandato cassado, levando alívio ao País, tão maltratado pela incúria administrativa e pelo desleixo moral da agora ex-presidente e de seu partido, um punhado de notórios personagens da vida política – desses que não se consegue identificar bem na escala biológica, porque são ao mesmo tempo animais de pluma, couro e escama – aproveitou a deixa para urdir uma maracutaia digna de uma república bananeira. O objetivo, claro, foi beneficiar todos os políticos facínoras que a Justiça está por alcançar. Mas o resultado da trama, do qual essa chusma de irresponsáveis talvez nem tenha se dado conta, é que o governo de Michel Temer, do qual vários deles esperam fazer parte e colher seu quinhão, corre o risco de terminar antes mesmo de começar (ver o editorial Dá para olhar para a frente?).

Como toda maquinação, esta não ficou clara senão pouco a pouco, minuto a minuto, para assombro geral, em meio ao drama da votação que determinou o impeachment de Dilma no Senado. As coisas ficaram meridianamente claras quando a bancada do PT fez ao presidente da sessão, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, um pedido de destaque por meio do qual pretendia que houvesse duas votações: uma sobre a perda do mandato e outra sobre a perda dos direitos políticos de Dilma. O argumento, mais um da inesgotável coleção de chicanas petistas, era que não havia vinculação entre a cassação e a inabilitação.

Tivesse o ministro Lewandowski um mínimo de familiaridade com o artigo 52 da Constituição, o pedido teria sido rejeitado sem maiores considerações. Esse artigo, que estabelece a competência do Senado para processar e julgar o presidente, diz em seu parágrafo único que a condenação, proferida por dois terços dos votos dos senadores, será limitada “à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”. Salvo se o uso da preposição “com” ganhou significado oposto ao que manda a boa gramática, não é possível concluir outra coisa desse artigo senão que a inabilitação para o exercício de cargos públicos acompanha, necessariamente, a perda do cargo de presidente.

O fato é que aqueles que tramaram a cavilação estavam no seu dia de sorte. O ministro Lewandowski, não conhecendo o artigo 52, aceitou o destaque que fatiou a votação. E assim, com a inocente anuência do presidente do Supremo Tribunal Federal, a Constituição foi reescrita no joelho.

Adotada a escandalosa manobra, senadores revezaram-se em vexaminoso exercício de caradurismo para dar um mínimo de dignidade à esbórnia. A senadora Kátia Abreu, por exemplo, apelou à piedade dos colegas, ao dizer que Dilma, se ficasse inabilitada, teria de viver com uma aposentadoria de meros R$ 5 mil. Já o presidente do Senado, Renan Calheiros, cujas digitais estão por toda a parte nesse caso, brandindo um exemplar da Constituição, disse que “não podemos ser desumanos” com Dilma. O ministro Lewandowski, com ternura cristã, alertou os parlamentares que Dilma, se fosse inabilitada, não poderia ser “nem merendeira de escola”.

Assim, o impeachment de Dilma passou, mas seus direitos políticos foram preservados. A punição pela metade não garantirá a Dilma um emprego de merendeira, mas se presta a livrar plumas, couros e escamas de figuras graúdas do Congresso que estão enroladas na Justiça, algumas das quais com assento nas mesas que dirigiram os trabalhos desse processo e que deveriam estar conscientes de sua responsabilidade perante a Nação.

Trinta e nove senadores que garantiram os direitos políticos da ex-presidente comprovaram que o brasileiro não tem “complexo de vira-latas” por causa das vicissitudes do futebol, mas porque é reduzido a essa condição por políticos agrupados em matilhas.


Essa imoralidade abre precedente para uma catadupa de escândalos. O que aconteceu ontem não foi motivo apenas para que o PSDB e o DEM ameaçassem romper a coalizão com o governo Temer, comprometendo todo o esforço de recuperação nacional. Trata-se de um episódio que expõe a inesgotável capacidade da classe política nacional de trair a confiança dos brasileiros de bem.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Quando a instituição prevalece


Habituado a servir-se das instituições republicanas em benefício de seus interesses e conveniências políticas, o lulopetismo sofreu mais um fragoroso revés na sessão plenária do Senado Federal que transformou Dilma Rousseff em ré do processo de impeachment, colocando-a, finalmente, a um passo de ser definitivamente afastada da Presidência da República. Na condição de presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), investido, por disposição constitucional, na condução dos trabalhos, o ministro Ricardo Lewandowski frustrou todas as tentativas da tropa dilmista de obstruir a sessão. O ministro se comportou com imparcialidade, serenidade e firmeza e, logo na abertura dos trabalhos, recomendou aos senadores, que ali estavam na condição de juízes, “atuar com independência, pautando-se exclusivamente pelos ditames das consciências e pelas normas legais”. Não foi exatamente o que aconteceu, como vieram a demonstrar as bisonhas tentativas procrastinatórias de quem talvez imaginasse que poderia contar com a cumplicidade de um ministro-companheiro. Mas o desempenho de Lewandowski demonstrou seu compromisso com a solidez institucional que é indispensável à estabilidade do regime democrático.

O fato de ter sido nomeado para a Suprema Corte pelo então presidente Lula da Silva e sua atuação como revisor do processo do mensalão, que frequentemente o colocou em conflito com o ministro-relator Joaquim Barbosa, levantaram dúvidas sobre se Lewandowski favoreceria o PT. Já a partir de sua eleição para a presidência da Suprema Corte, porém, e especialmente depois de aberto o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, Lewandowski demonstrou claramente que, se cultivava preferências partidárias, era capaz de mantê-las apartadas de suas responsabilidades como magistrado.

Já os militantes petistas, dentro e fora do Congresso, aferrados à convicção de que são os únicos representantes legítimos “do povo” e por isso podem contar com a indulgência geral e divina para lançar mão de qualquer meio para atingir seus objetivos, não se embaraçam com detalhes éticos e morais. Uma demonstração prática desse modo de pensar e agir tem sido dada pela tropa de choque dilmista ao longo de toda a tramitação, no Congresso Nacional, do processo de impeachment. Desde a classificação de “golpe” imposta a um processo que tem o apoio do Congresso Nacional e segue um rito determinado pelo STF, passando pela pecha de “usurpador” que procura colar à imagem de um vice-presidente da República constitucionalmente investido no exercício da Presidência, o lulopetismo não tem o menor escrúpulo de “partir para cima” de tudo e todos que a ele se opõem.

E foi seguindo essa linha suicida de comportamento que os defensores de Dilma – na verdade, defensores, acima de tudo, de sua própria sobrevivência política – tiveram o descaramento de, provavelmente iludidos com a possibilidade de contar com a indulgência de um ministro-companheiro, levantar naquela sessão do Senado questões de ordem despropositadas como as destinadas a, simplesmente, suspender o processo contra Dilma ou, pelo menos, adiar a votação programada para permitir a realização de “novas e importantes diligências”. Essas tentativas despudoradas e bisonhas de tumultuar os trabalhos – e garantir exposição diante das câmeras de televisão – foram firme e serenamente rechaçadas pelo ministro Ricardo Lewandowski. Só falta agora a tigrada acusá-lo de “traição”.


Este lamentável episódio do impeachment completa três meses desde o afastamento provisório da Presidência da “mulher honesta” que começa a ganhar visibilidade na Operação Lava Jato. É uma nódoa que só será extinta com o tempo e a união dos brasileiros em torno do enorme desafio de tirar o País da crise em que foi jogado por Dilma e seu mestre e criador arrependido. Menos mal que o Brasil ainda pode contar com instituições sólidas, como ficou demonstrado na histórica sessão do Senado de terça-feira.

O Estado de São Paulo, 11/8/2016

terça-feira, 9 de agosto de 2016

A democracia


É incrível a vocação centralizadora e autoritária da nossa cultura política. Todos acham que se o Poder Executivo apresentar um projeto de lei não poderá ele ser trabalhado com o Poder Legislativo. Quantas vezes tenho lido e ouvido, ao mandar projeto ao Legislativo e ajustar os seus termos, que o “governo recuou”. Grande engano.

Vivemos numa democracia. Isso significa que o Legislativo, assim como o Judiciário também governam. O Legislativo não é mero chancelador dos atos do Executivo. Ao contrário. Propõe, sugere, acrescenta, modifica. Nos últimos tempos temos procurado chegar a um consenso sobre a proposta de texto legal com as duas Casas congressuais, a Câmara e o Senado. Estabelecemos diálogo na convicção de que assim se exerce o poder popular descrito na Constituição federal. O exercício do poder unitário, unipessoal só é encontrável nas ditaduras.

Mas compreendo, sociologicamente, a nossa vocação centralizadora. Basta apanhar a História do Brasil desde os tempos da colônia. Primeiro, ganhamos as capitanias hereditárias, depois, o governo geral. Em seguida veio o Império, com o Estado unitário. Depois, na República, tivemos um ciclo de 20 a 30 anos de aparente descentralização, seguido de 20 anos de concentração. Foi assim de 1891 a 1930, de 1930 a 1945, de 1945 a 1964 e daí até 1988.

Esses ciclos históricos revelam que a tendência centralizadora absoluta é marca da nossa concepção política. As pessoas sempre almejam que a União cuide de tudo e de todos e, na União, o Executivo (sempre identificado como governo) tudo controle. Trata-se, aliás, da tendência de considerar o Poder Executivo como salvador da Pátria, supridor das demandas da sociedade, a cujo “poder da caneta” os outros Poderes sempre recorrem, buscando apoio e, sobretudo, recursos. Cientistas sociais, como Maurice Duverger, chegam a apontar a alta concentração do poder nas mãos do comando do Executivo como uma característica da América Latina, tradição que vem desde os tempos da colonização e da cultura ibérica.

Nos colonizadores concentrava-se toda a força e essa condição de certa forma se enraizou no presidencialismo, como podemos identificar entre nós, quando a República tomou o lugar do Império. Tornou-se bastante comum por aqui o recorrente conceito sobre o “presidencialismo” de cunho imperial com que se procura caracterizar a força do nosso sistema de governo, situação que deixaria em desequilíbrio a tríade de Poderes arquitetada por Montesquieu.

É fato, entretanto, que a democracia, entendida como governo de todos (afinal, o poder emana do povo), é exercida pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas é dificilmente compreendida. Volto a registrar que a ideia reinante é de que o Executivo produz e o Legislativo deve simplesmente aprovar. Um contrassenso. Não é nem deve ser assim. De igual maneira, a Federação. Nela União e Estados são autônomos. A União não pode interferir nas competências dos Estados sob pena de inconstitucionalidade. A eles, Estados, cabem as chamadas competências residuais. Ou seja: cabe-lhes o resíduo, o resto, do que não foi expressamente conferido à União e aos municípios. Entre as residuais, a principal delas é a competência para dispor sobre sua administração interna. A organização, a estrutura, os direitos e deveres dos seus servidores constituem o núcleo da sua competência residual. É tão grave a eventual incursão da lei federal sobre as competências dos Estados que a Constituição federal chega a registrar o impedimento de emenda constitucional que vise a abolir a Federação. Ou seja, é preciso preservar a competência dos Estados (artigo 60, § 4.º, I).
Por outro lado, a mesma Constituição prevê a intocabilidade da separação de Poderes (artigo 60, § 4.º, III).

Faço essas afirmações para pré-concluir: 1) é indisfarçável a nossa tendência à concentração; 2) a nossa História assim o registra; 3) as nossas instituições estão funcionando regularmente, sem interferência de um Poder em outro; 4) temos, agora, a oportunidade de romper com esse ciclo histórico de agressão à separação de Poderes e à Federação, suportes de uma democracia.

Também me expresso dessa maneira a propósito de projeto de lei que estabelece a repactuação da dívida dos Estados com a União, embutindo nela um teto de gastos para os Estados. Trata-se de teto geral, passível de revisão anual apenas pelo índice de inflação. Tal, aliás, como estamos fazendo com os limites de gastos da União. No primeiro momento, o projeto continha regras referentes à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Chegando à Câmara dos Deputados, dialogamos, conversamos, negociamos e fizemos, por acordo, o projeto manter-se nos parâmetros constitucionais para apresentar, logo em seguida, atualização da LRF. Tudo em consonância com a Constituição federal, artigo 169, que autoriza que lei complementar estabeleça limites para o pessoal ativo e inativo. No caso, o limite de despesas primárias correntes está limitado à variação da inflação. É quanto basta. Se os Estados decidirem criar despesas em algumas áreas, no exercício de sua autonomia, deverão retirar esses valores de outros gastos. Importa obedecer ao limite de gastos previsto no projeto, respaldado pelo artigo 169 da Constituição federal.

Este escrito se destina a evidenciar que minha conduta se respalda na Constituição federal. Digo mais: minha formação democrática me impede gestos autoritários. Não os praticarei. Esse é o caminho para a consolidação de um sistema participativo que nos levará ao ajuste fiscal necessário, ao crescimento, com o combate ao desemprego, ao desenvolvimento e à paz social, tão desejada pela imensa maioria do povo brasileiro.

Cabe aos críticos do governo, àqueles que aludem a “recuos”, escolher a via que desejam: o autoritarismo, quando não há diálogo, ou a democracia. A minha escolha já está feita. Dela não me desviarei.

Michel Temer, presidente da República em exercício

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Como se autodestruir por completo


“Nunca entre num lugar de onde tão poucos conseguiram sair”, alertou Adam Smith. “A consciência tranquila ri-se das mentiras da fama”, cravou o romano Ovídio. 

E na contramão de todos está alguém que abriu mão de si mesmo pelo poder. Lula construiu uma história de vida capaz de arrastar emoções e o levar à presidência. Agora, de modo desprezível, o mesmo Lula destrói-se por completo.
Não é preciso resgatar o tríplex, o sítio ou os R$ 30 milhões em “palestras” para atestar a derrocada do ex-presidente. Basta tão somente reparar a figura pitoresca na qual Lula se tornou.
O operário milionário sempre esbanjou o apoio popular e tomou para si o mérito de salvar o país da miséria. Contudo, junto disso, entregou-se aos afetos das maiores empreiteiras, não viu mal em lotear a máquina pública, nem constrangeu-se em liderar uma verdadeira organização criminosa.
Sem hesitar, brincou com os sonhos do povo e fez de seu filho, ex-faxineiro de zoológico, um megaempresário. Aceitou financiamentos regados à corrupção, fez festa junina pra magnatas e mentiu, mentiu e mentiu. O resultado, enfim, chegou: ao abrir mão de si mesmo, Lula perdeu o povo.
Pelas ruas, o ex-presidente é motivo de indignação e fonte de piadas. Lula virou chacota, vergonha, deboche. Restou-lhe a militância do pão com salame e aqueles que tratam a política com os olhos da fé messiânica.
Seu escárnio da lei confirma sua queda. Lula ainda enxerga o Brasil como um rebanho de gados e não percebe que está só, cercado por advogados que postergam seu coma moral. Enquanto ofende o judiciário e todos aqueles que não beijam seus pés, Lula trancafia-se na bolha de quem ainda acredita que meia dúzia de gritos e cuspes podem apagar os fatos.
O chefe entrou num mundo sem saída, trocou sua consciência pelo poder e corrompeu-se até dissolver sua essência. Lula morreu faz tempo. Restou-lhe, apenas, uma carcaça podre que busca a vida eterna no inferno de si mesmo.

Gabriel Tebaldi (graduado em História pela Ufes)

sábado, 30 de julho de 2016

Habeas corpus preventivo



Se Lula da Silva for preso proximamente pela Polícia Federal, não importa por qual motivo, parecerá ao mundo que é vítima de retaliação pelo fato de ter “denunciado” o Estado brasileiro ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) pelo “abuso de poder” que teria sido praticado contra ele pelo juiz federal Sérgio Moro e pelos procuradores da Operação Lava Jato. Pois foi certamente por esse motivo esperto – a garantia de uma espécie de habeas corpus preventivo com aval internacional – que o chefão do PT foi apresentado como vítima de perseguição política. No mesmo dia, a Operação Lava Jato tornou público um laudo pericial da Polícia Federal que revela a existência de fortes indícios de que o casal Lula-Marisa Letícia tenha dado instruções específicas aos encarregados de realizar a instalação de uma “cozinha gourmet”, no valor de R$ 252 mil, no aprazível sítio de Atibaia que ambos negam veementemente ser de sua propriedade. E, no dia seguinte, Lula da Silva tornou-se réu, acusado de obstrução da Justiça.

Diante do amplo elenco de ilicitudes de que Lula é suspeito de ter praticado desde que assumiu a Presidência em 2003, a tentativa de ocultar a propriedade de imóveis como o de Atibaia é café pequeno. Não se compara à responsabilidade que lhe é atribuída, por óbvia, de ser o chefe da quadrilha que por mais de uma década aparelhou o Estado, cooptou aliados a peso de ouro e assaltou os cofres públicos, especialmente os das empresas estatais, com o objetivo de perpetuar um projeto de poder e enriquecer políticos, funcionários públicos e empresários inescrupulosos.

Alegam os filopetistas, de modo especial os intelectuais e artistas que gostam de parecer paladinos da justiça social, que o lulopetismo inaugurou uma era de conquistas populares e de desenvolvimento econômico, e que para fazê-lo teve de se submeter ao constrangimento de alianças indesejáveis, mas necessárias ao ato de governar. Ou seja: os fins justificam os meios. Mas o que na verdade resultou provado com o catastrófico desenlace da aventura lulopetista é que os meios explicam o fim do sonho de um projeto de poder que pode ter até nascido com as melhores intenções, mas que ao longo do caminho se deixou perder pela soberba, pela incompetência e pela corrupção.

Hoje, os brasileiros sofrem com o legado de desesperança que receberam de Lula e de sua desafortunada sucessora. Depois de ter frustrado todas as expectativas criadas por um perverso populismo que dividiu o País entre “nós” e “eles”, Lula vê agora frustrada sua própria expectativa de ter repouso virginal no panteão dos grandes heróis internacionais das causas populares. E reage com a mesma falta de escrúpulos que o levou aos descaminhos da moralidade na tentativa de se safar das consequências legais de seus trambiques. Pouco se lhe dá se, assim procedendo, enxovalha a imagem do Brasil no principal foro político internacional. Pois, recorrendo ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, Lula pode querer denegrir o juiz Moro, mas o que de fato faz é tentar comprometer o Estado brasileiro, insinuando que suas instituições são inermes diante do arbítrio de um funcionário. Com essa atitude mendaz, Lula quer fazer crer ao mundo que a Lava Jato transformou o País numa republiqueta refém do “abuso de poder” de uma autoridade judicial que peca pela “clara falta de imparcialidade” e se dedica a sucessivos “atos ilegais” movida pela obsessão de condená-lo.

Esse é o inescrupuloso estilo lulopetista de se safar de dificuldades: atirar para todos os lados, não importa quem possa ser atingido. É assim que Lula e sua tigrada se têm comportado desde o início do processo de impeachment contra Dilma Rousseff, acionando suas relações nos círculos e foros esquerdistas internacionais para veicular a versão de que o Brasil está sendo vítima de um “golpe”.


É improvável que a “denúncia” de Lula progrida. Entre outros motivos, porque antes de o Comitê da ONU se manifestar sobre a petição, será necessário que Lula prove ter esgotado todos os recursos legais no Brasil para se livrar do “abuso de poder”. E mesmo que se configure a improvável hipótese de que a “denúncia” seja aceita para julgamento, a análise do processo pode se estender por cerca de dois anos. Para Lula, isso pouco importa. O que ele quer é manter a Polícia Federal longe de sua porta.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Um legado de Dilma


O cinismo e a hipocrisia dos depoimentos prestados em Curitiba, no âmbito da Operação Lava Jato, pelo marqueteiro oficial das últimas campanhas presidenciais do PT e por sua companheira e cúmplice, ao trazerem a público aquilo que todo mundo sempre soube e doravante a honesta Dilma não poderá continuar negando, evidenciam a completa deterioração dos padrões de moralidade naquilo que a política tem de mais vital: o jogo eleitoral. Não se pode dizer, numa República que teve suas primeiras décadas marcadas pela ampla manipulação do resultado das urnas, que a fraude eleitoral seja uma novidade. Mas há pouco mais de 35 anos entrou em cena um partido que, apresentando-se como dono da verdade e da virtude, logrou tornar-se a mais importante força política graças à anunciada disposição de lutar “contra tudo isso que está aí”.

Pois é exatamente esse, o Partido dos Trabalhadores, que aliado ao que há de pior na vida pública e privada – do coronelismo nordestino ao banditismo sindical e empresarial – cometeu um escandaloso estelionato eleitoral em 2014. Por força do exagero da sede com que foi ao pote, o PT acabou prestando à democracia brasileira o favor de facilitar a tarefa das investigações policiais que lancetaram o tumor da corrupção e deixaram vazar a secreção pútrida das práticas mentirosas e ilegais das campanhas eleitorais.

Se permanecesse fiel a suas promessas de moralizar a política, o PT poderia ter usado o grande poder político de que por algum tempo dispôs para pelo menos minimizar as práticas criminosas que comprometem a lisura das urnas. Em vez disso, as campanhas eleitorais se tornaram cada vez mais caras e contaminadas por práticas ilegais, como admitiu João Santana em seu depoimento ao juiz Moro: “Acho que é preciso rasgar o véu da hipocrisia que cobre as relações políticas eleitorais no Brasil e no mundo”.

Mônica Moura, que era responsável pela administração financeira da dupla, admitiu ter recebido, “como caixa 2, mesmo”, US$ 4,5 milhões relativos à campanha presidencial de 2010. E explicou: “Os partidos não querem declarar o valor real que recebem das empresas e as empresas não querem declarar o quanto doam. Ficamos no meio disso. Não era uma opção minha, mas uma prática não só do PT, mas de todos os partidos”.

O casal tentou fazer crer que não contou nada no interrogatório que se seguiu à prisão, no início do ano, porque tinha a intenção de preservar a imagem de Dilma Rousseff: “Eu achava que isso poderia prejudicar a presidente Dilma”, afirmou o publicitário. “Eu que ajudei, de certa maneira, a eleição dela, não seria a pessoa que iria destruir a presidente.” Mônica Moura acrescentou: “Para ser sincera, eu não quis incriminá-la, porque achava que ia piorar a situação. Queria apenas me poupar de piorar a situação”. Pelo jeito, nenhum dos dois entende que haja agora alguma maneira de impedir que a “situação” de Dilma piore.


Os marqueteiros de Dilma não deixam dúvidas: a corrupção faz parte do catastrófico legado dela.

O Estado de São Paulo - Editorial - 23/7/2016

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Convictos ou Fanáticos?


Olhando o antigo trilho do trem de chegada dos prisioneiros, atravessei o portão de ferro onde estava escrita a histórica frase"Arbeit macht frei" (O trabalho liberta). Era um momento de reflexão, pois eu entrava no primeiro campo de concentração nazista denominado "Dachau", que serviu de modelo na segunda guerra mundial, localizado perto da cidade de Munique na Alemanha.

Passaram por Dachau aproximadamente duzentas mil pessoas: negros, ciganos, homossexuais, deficientes físicos e mentais, testemunhas de Jeová, comunistas, judeus etc. Todos aqueles que na ótica do nazismo prejudicariam a superioridade de uma raça.

Caminhei pelos pavilhões, vi os apertados dormitórios, os sanitários coletivos, onde vários homens e mulheres utilizavam ao mesmo tempo e sem qualquer divisória. Emocionei-me quando entrei na traiçoeira câmera de gás, em que as pessoas pensavam que teriam água no chuveiro. Observei as fornalhas do crematório. Era quase inacreditável admitir que tudo aquilo tinha acontecido.

Por que, perguntei a mim mesmo, há apenas 80 anos o povo deste atual país de excelente qualidade de vida, permitiu-se em sua maioria se fanatizar por uma proposta tão absurda? Por que seguiu lideranças que afirmavam que purificar a raça humana seria colaborar com Deus? Por que criou ídolos de barro? Por que desumanizou-se a este ponto?

Ninguém se torna fanático da noite para o dia. Começa devagarzinho, alicerçado em lacunas no caráter, que ao serem alimentadas pelo orgulho, vão anestesiando o nosso discernimento. O orgulho é o inverso da humildade. Esta última quem tem pensa que não tem, e quem pensa que tem, não tem.

Se nos perguntarem se somos fanáticos, talvez até nos sintamos ofendidos, e salvo raras exceções, afirmaremos que não. O fanático ou quem está a caminho de se tornar, dificilmente percebe o seu estado, pois já foi ou está sendo absorvido pela ausência de autocrítica, quando imprudentemente descartou um sábio ensinamento do passado: "conhece-te a ti mesmo".

Algumas perguntas reflexivas poderão nos ajudar pelos campos da vida, sejam em ambiências políticas, religiosas ou diversas:

- Escutamos com respeito o contraditório ou apenas queremos convencer o interlocutor colocando-o na condição de aprendiz?

- Acessamos livros, revistas, jornais, programas, blogs etc. de quem pensa diferente, enriquecendo-nos na diversidade, ou optamos por amaldiçoar o diferente criando um novo "índex" e, quando o acessamos, o único objetivo é detectar falhas para alimentar os nossos argumentos?

- Estamos sendo honestos intelectualmente com a verdade dos fatos ou usamos critérios diferenciados para episódios semelhantes?

- Invertemos os papéis, mas mantendo os mesmos fatos, para verificar se as nossas conclusões continuariam as mesmas ou a dureza do nosso discurso só serve para os que pensam diferente?

- Quando recebemos informações sobre os nossos contraditores, analisamos a veracidade e a pertinência em divulgá-las ou compartilhamos sem qualquer preocupação ética?

- Dialogamos de forma civilizada ou nos desequilibramos saindo do campo das ideias para adjetivar os seus autores?

- Relembramos de anteriores mudanças de posições pessoais, que no passado tínhamos como pétreas, ou nos colocamos na imutabilidade divina?

É na abertura para a análise equilibrada do contraditório, do diferente, que geralmente encontraremos o incentivo à inovação e ao arejamento das nossas ideias, às vezes já empoeiradas pelos limites do nosso "status quo". Tenhamos uma janela aberta para novos ares, para o futuro, para a vida. Não sejamos os modernos algozes de Galileu.

Atuemos na sociedade de forma cidadã, democrática, pacífica e sem nunca esquecer o alerta do saudoso Nazareno: orar e vigiar.


A consciência é a nossa juíza. Perguntemos para ela: somos convictos ou fanáticos?

Gezsler Carlos West, 19-05-2016

domingo, 15 de maio de 2016

Se arrependimento matasse...


Valem mais do que palavras as imagens do homem que estava atrás de Dilma Rousseff, na ensolarada manhã de quinta-feira em que ela cometia a temeridade de falar de improviso aos manifestantes reunidos diante do Palácio do Planalto para prestar solidariedade à presidente que acabava de ser afastada. As fotos estampadas em todos os jornais, de um homem tristonho, abatido, desanimado, a cofiar o bigode com o pensamento provavelmente perdido em reminiscências de mais de 15 anos, podem ser interpretadas numa singela legenda de três palavras: “Se arrependimento matasse...”

Era ele o responsável original pelo desastre econômico, político, social e moral que resultou no afastamento constitucional da mais incompetente e contestada presidente da história da República. Chama-se Luiz Inácio Lula da Silva. Mais de dois anos antes de concluir seu segundo mandato, Lula passou a dedicar-se à escolha monocrática de seu sucessor. Inebriado pelo status quase divino que naquele momento lhe era atribuído, Lula tinha em mente alguém que preenchesse pelo menos dois pré-requisitos indispensáveis.

Primeiro: não representar ameaça a sua liderança. Um sucessor que aceitasse a missão de tomar conta da cadeira presidencial por quatro anos, já que estava escrito nas estrelas que em 2014 o Grande Chefe retornaria triunfalmente ao Palácio do Planalto. O segundo requisito era mais sensato: o candidato à Presidência deveria ter inegáveis qualidades de administrador, já que o manejo da política ficaria, é claro, por conta do próprio Lula. Deu Dilma Rousseff, a “gerentona”, apresentada como uma lutadora rigorosamente honesta e devotada a servir o povo. E ainda oferecia a inédita vantagem: se eleita, seria a primeira mulher presidente da República.

Lula não se deu ao trabalho de consultar ninguém, e quando o fez cumpriu apenas mera formalidade. Ignorou a resistência do petismo à indicação de uma candidata oriunda do brizolismo e sem forte tradição de militância no partido, já conhecida por ter um temperamento difícil, autoritário, expresso pela maneira rude como tratava pares e subordinados. Lula manteve-se irredutível. Sabia que tinha prestígio suficiente para eleger, como dizia, um poste e o pleito seria, portanto, outra formalidade.

Mas bastou Dilma vestir a faixa de presidente para o projeto lulopetista de perpetuação no poder começar a dar com os burros n’água. A troca do pragmatismo populista de Lula pela autossuficiência dogmática de Dilma abriu espaço para os defensores da “nova matriz econômica”, que haviam obtido resultados positivos com as medidas anticíclicas pontuais de combate aos efeitos da crise mundial de 2009. Sob Dilma, a “nova matriz” passou a ser um programa de governo pautado pelo fortalecimento da intervenção do Estado na economia.

Exemplos disso foram as tentativas erráticas de induzir com incentivos e desonerações arbitrárias o crescimento de grupos nacionais escolhidos a dedo – os tais “campeões”. Em nome da “defesa dos interesses nacionais”, impôs restrições à participação do capital estrangeiro em empreendimentos públicos.

Paralelamente, permitiu que se ampliasse a farra com dinheiro público na tentativa de estimular a produção de bens não pelo apoio à atividade industrial, mas pela concessão de crédito farto aos consumidores. Essa medida foi a alegria do povo, até que este se descobriu endividado até o pescoço. Então, o crédito farto revelou-se também incapaz de sustentar a produção e de evitar o sucateamento da indústria.

Do ponto de vista político, a soberba e a prepotência de Dilma selaram o destino do governo petista já no começo do segundo mandato, quando ela tentou alijar o PMDB, o seu maior aliado, do comando do Parlamento.

O coroamento da obra veio com a violação ostensiva das leis de responsabilidade fiscal e orçamentária e o julgamento que poderá resultar na cassação do mandato de Dilma e no desprestígio fatal do PT.


Era o autor dessa façanha, o tal criador de postes, que cofiava o bigode atrás de Dilma, com expressão de réu arrependido.

O Estado de São Paulo, 15/5/2016

sexta-feira, 13 de maio de 2016

Ìntegra do discurso de Michel Temer em sua posse


Leia a íntegra do discurso de Michel Temer ao assumir a Presidência da República:

"Eu pretendia que esta cerimônia fosse extremamente sóbria e discreta, como convém ao momento que vivemos. Entretanto, eu vejo o entusiasmo dos colegas parlamentares, dos senhores governadores, e tenho absoluta convicção de que este entusiasmo deriva, precisamente, da longa convivência que nós todos tivemos ao longo do tempo. Até pensei, num primeiro momento, que não lançaria nenhuma mensagem neste momento. Mas percebi, pelos contatos que tive nestes dois últimos dias, que indispensável seria esta manifestação.

E minha primeira palavra ao povo brasileiro é a palavra confiança. Confiança nos valores que formam o caráter de nossa gente, na vitalidade da nossa democracia; confiança na recuperação da economia nacional, nos potenciais do nosso país, em suas instituições sociais e políticas e na capacidade de que, unidos, poderemos enfrentar os desafios deste momento que é de grande dificuldade.

Reitero, como tenho dito ao longo do tempo, que é urgente pacificar a Nação e unificar o Brasil. É urgente fazermos um governo de salvação nacional. Partidos políticos, lideranças e entidades organizadas e o povo brasileiro hão de emprestar sua colaboração para tirar o país dessa grave crise em que nos encontramos. O diálogo é o primeiro passo para enfrentarmos os desafios para avançar e garantir a retomada do crescimento. Ninguém, absolutamente ninguém, individualmente, tem as melhores receitas para as reformas que precisamos realizar. Mas nós, governo, Parlamento e sociedade, juntos, vamos encontrá-las.

Eu conservo a absoluta convicção de que é preciso resgatar a credibilidade do Brasil no concerto interno e no concerto internacional, fator necessário para que empresários dos setores industriais, de serviços, do agronegócio, e os trabalhadores, enfim, de todas as áreas produtivas se entusiasmem e retomem, em segurança, com seus investimentos. Teremos que incentivar, de maneira significativa, as parcerias público-privadas, na medida em que esse instrumento poderá gerar emprego no País.

Sabemos que o Estado não pode tudo fazer. Depende da atuação dos setores produtivos: empregadores, de um lado, e trabalhadores de outro. São esses dois polos que irão criar a nossa prosperidade. Ao Estado compete –vou dizer, aqui, o óbvio–, compete cuidar da segurança, da saúde, da educação, ou seja, dos espaços e setores fundamentais, que não podem sair da órbita pública. O restante terá que ser compartilhado com a iniciativa privada, aqui entendida como a conjugação de ação entre trabalhadores e empregadores.

O emprego, sabemos todos, é um bem fundamental para os brasileiros. O cidadão, entretanto, só terá emprego se a indústria, o comércio e as atividades de serviço, estiverem todas caminhando bem.

De outro lado, um projeto que garanta a empregabilidade, exige a aplicação e a consolidação de projetos sociais. Por sabermos todos, que o Brasil lamentavelmente ainda é um País pobre. Portanto, reafirmo, e o faço em letras garrafais: vamos manter os programas sociais. O Bolsa Família, o Pronatec, o Fies, o Prouni, o Minha Casa Minha Vida, entre outros, são projetos que deram certo, e, portanto, terão sua gestão aprimorada. Aliás, aqui mais do que nunca, nós precisamos acabar com um hábito que existe no Brasil, em que assumindo outrem o governo, você tem que excluir o que foi feito. Ao contrário, você tem que prestigiar aquilo que deu certo, completá-los, aprimorá-los e insertar outros programas que sejam úteis para o País. Eu expresso, portanto, nosso compromisso com essas reformas.

Mas eu quero fazer uma observação. É que nenhuma dessas reformas alterará os direitos adquiridos pelos cidadãos brasileiros. Como menos fosse sê-lo-ia pela minha formação democrática e pela minha formação jurídica. Quando me pedirem para fazer alguma coisa, eu farei como Dutra, o que é diz o livrinho? O livrinho é a Constituição Federal.

Nós temos de organizar as bases do futuro. Muitas matérias estão em tramitação no Congresso Nacional, eu até não iria falar viu, mas como todo mundo está prestando atenção, eu vou dar toda uma programação aqui. As reformas fundamentais serão fruto de um desdobramento ao longo do tempo. Uma delas, eu tenho empenho e terei empenho nisso, porque eu tenho nela, é a revisão do pacto federativo. Estados e municípios precisam ganhar autonomia verdadeira sobre a égide de uma federação real, não sendo uma federação artificial, como vemos atualmente.

A força da União, nós temos que colocar isso na nossa cabeça, deriva da força dos estados e municípios. Há matérias, meus amigos, controvertidas, como a reforma trabalhista e a previdenciária. A modificação que queremos fazer, tem como objetivo, e só se este objetivo for cumprido é que elas serão levadas adiante, mas tem como objetivo o pagamento das aposentadorias e a geração de emprego. Para garantir o pagamento, portanto. Tem como garantia a busca da sustentabilidade para assegurar o futuro.

Esta agenda, difícil, complicada, não é fácil, ela será balizada, de um lado pelo diálogo e de outro pela conjugação de esforços. Ou seja, quando editarmos uma norma referente a essas matérias, será pela compreensão da sociedade brasileira. E, para isso, é que nós queremos uma base parlamentar sólida, que nos permita conversar com a classe política e também com a sociedade.

Executivo e legislativo precisam trabalhar em harmonia e de forma integrada. Até porque no Congresso Nacional é que estão representadas todas as correntes da opinião da sociedade brasileira, não é apenas no executivo. Lá no Congresso Nacional estão todos os votos de todos os brasileiros. Portanto, nós temos que governar em conjunto.

Então, nós vamos precisar muito da governabilidade e a governabilidade exige –além do que eu chamo de governança que é o apoio da classe política no Congresso Nacional– precisam também de governabilidade, que é o apoio do povo. O povo precisa colaborar e aplaudir as medidas que venhamos a tomar. E nesse sentido a classe política unida ao povo conduzirá ao crescimento do País. Todos os nossos esforços estarão centrados na melhoria dos processos administrativos, o que demandará maior eficácia da governança pública.

A moral pública será permanentemente buscada por meio dos instrumentos de controle e apuração de desvios. Nesse contexto, tomo a liberdade de dizer que a Lava Jato tornou-se referência e como tal, deve ter (falha no áudio) e proteção contra qualquer tentativa de enfraquecê-la.

O Brasil, meus amigos, vive hoje sua pior crise econômica. São 11 milhões de desempregados, inflação de dois dígitos, déficit quase de R$ 100 bilhões, recessão e também grave a situação caótica da saúde pública. Nosso maior desafio é estancar o processo de queda livre na atividade econômica, que tem levado ao aumento do desemprego e a perda do bem-estar da população.

Para isso, é imprescindível, reconstruirmos os fundamentos da economia brasileira. E melhorarmos significativamente o ambiente de negócios para o setor privado. De forma que ele possa retomar sua rotação natural de investir, de produzir e gerar emprego e renda.

De imediato, precisamos também restaurar o equilíbrio das contas públicas, trazendo a evolução do endividamento no setor público de volta ao patamar de sustentabilidade ao longo do tempo. Quanto mais cedo formos capazes de reequilibrar as contas públicas, mais rápido conseguiremos retomar o crescimento.

A primeira medida, na linha dessa redução, está, ainda que modestamente, aqui representada, já eliminamos vários ministérios da máquina pública. E, ao mesmo tempo, nós não vamos parar por aí. Já estão encomendados estudos para eliminar cargos comissionados e funções gratificadas. Sabidamente funções gratificadas desnecessárias. Sabidamente, na casa de milhares e milhares de funções comissionadas.

Eu quero, também, para tranquilizar o mercado, dizer que serão mantidas todas as garantias que a direção do Banco Central hoje desfruta para fortalecer sua atuação como condutora da política monetária e fiscal. É preciso, meus amigos, e aqui eu percebo que eu fico dizendo umas obviedades, umas trivialidades, mas que são necessárias porque, ao longo do tempo, eu percebo como as pessoas vão se esquecendo de certos conceitos fundamentais da vida pública e da vida no Estado.

Então, quando eu digo "é preciso dar eficiência aos gastos públicos", coisa que não tem merecido maior preocupação do Estado brasileiro, nós todos estamos de acordo com isso. Nós precisamos atingir aquilo que eu chamo de "democracia da eficiência". Porque se, no passado, nós tivemos, por força da Constituição, um período da democracia liberal, quando os direitos liberais foram exercitados amplamente. Se, ao depois, ainda ancorado na Constituição, nós tivemos o desfrute dos chamados direitos sociais, que são previstos na Constituição, num dado momento aqueles que ascenderam ao primeiro patamar da classe média, começaram a exigir eficiência, eficiência do serviço público e eficiência nos serviços privados. E é por isso que hoje nós estamos na fase da democracia da eficiência, com o que eu quero contar com o trabalho dos senhores ministros, do Parlamento e de todo o povo brasileiro.

Eu quero também remover - pelo menos nós faremos um esforço extraordinário para isto –a incerteza introduzida pela inflação dos últimos anos. Inflação alta - vai mais uma trivialidade –atrapalha o crescimento, desorganiza a atividade produtiva e turva o horizonte de planejamento dos agentes econômicos. E sabe quem sofre as primeiras consequências dessa inflação alta? É a classe trabalhadora e os segmentos menos protegidos da sociedade, é que pagam a parte mais pesada dessa conta.

Nós todos sabemos que, há um bom tempo, o mundo está de olho no Brasil. Os investidores acompanham, com grande interesse, as mudanças no nosso país. Havendo condições adequadas –e nós vamos produzi-las–, a resposta será rápida, pois é grande a quantidade de recursos disponíveis no mercado internacional e até internamente, e ainda maior as potencialidades no nosso País. E com base no diálogo, nós adotaremos políticas adequadas para incentivar a indústria, o comércio, os serviços e os trabalhadores. E a agricultura, tanto a familiar quanto o agronegócio. Precisamos prestigiar a agricultura familiar, que é quase um microempreendimento na área da agricultura, especialmente apoiando e incentivando os micros, pequenos e médios empresários. Além de modernizar o País, estaremos realizando o maior objetivo do governo: reduzir o desemprego. Que há de ser, os senhores percebem, estou repetindo esse fato porque eu tenho tido - e os senhores todos têm tido -, contato em todas as partes do País, com famílias desempregadas. E nós vemos o desespero desses brasileiros, que contam com um País com potencialidades extraordinárias e que não consegue levar adiante uma política econômica geradora de empregos para todos os brasileiros.

Quero falar um pouco sobre a atuação nas linhas interna e externa do Brasil. E esses princípios estão consagrados na Constituição de [19]88, senador Mauro Benevides, que nós ajudamos a redigir, não é? Eu indico, porque esses preceitos indicam caminho natural para definição das linhas da atuação interna e externa do Brasil. Os senhores veem que eu insisto muito no tema da Constituição porque, ao meu modo de ver, toda vez que nós nos desviamos dos padrões jurídicos, e o Direito existe, exata e precisamente, para regular as relações sociais, quando nós nos desviamos as (incompreensível) dos limites do Direito, nós criamos a instabilidade social e a instabilidade política. Por isto eu insisto sempre em invocação do texto constitucional.

Muito bem, nesta Constituição, a independência nacional, a defesa da paz e da solução pacífica de conflitos, o respeito à autodeterminação dos povos, a igualdade entre os estados, a não-intervenção, a centralidade dos direitos humanos e o repúdio ao racismo e ao terrorismo, dentre outros princípios, são valores profundos da nossa sociedade. E traça uma imagem de um País pacífico e ciente dos direitos e deveres estabelecidos pela nossa Constituição.

São, meus amigos, esses elementos de consenso que nos permite estabelecer bases sólidas para a política externa que volte a representar os valores e interesses permanentes no nosso País. A recuperação do prestígio do País e da confiança em seu futuro serão tarefas iniciais e decisivas para o fortalecimento da inserção internacional da nossa economia.

Agora em agosto o Brasil estará no centro do mundo com a realização das Olimpíadas no Rio de Janeiro. Bilhões de pessoas assistirão jogos, jornalistas de vários países estarão presentes para reportar o país-sede das competições. Muito além dos esportes, sabemos disso, as pautas se voltaram para as condições políticas e econômicas do País. Tão cedo não voltaremos oportunidade como esta de atrair a atenção de tanta gente, ao mesmo tempo, em todos os cantos do mundo.

Nesta tarde de quinta-feira, porém, e desde já pedindo desculpas pelo possível, para usar um refrão, pelo possível alongado da exposição, eu quero dizer, reiterar, que a minha intenção era realizar essa cerimônia, digamos assim, com a maior sobriedade possível. Estamos fazendo porque, sem embargo do entusiasmo de todos os senhores, todos nós compreendemos o momento difícil, delicado, ingrato que estamos todos passando.

Por isso, nessa tarde de quinta-feira não é momento para celebrações, mas para uma profunda reflexão: é o presente e o futuro que nos desafiam e não podemos olhar para frente com os olhos de ontem. Olhamos com olhos no presente e olhos no futuro.

Faço questão, e espero que sirva de exemplo, e declarar meu absoluto respeito institucional à senhora presidente Dilma Rousseff. Não discuto aqui as razões pelas quais foi afastada. Quero apenas sublinhar a importância do respeito às instituições e a observância à liturgia nas questões, no trato das questões institucionais. É uma coisa que nós temos que recuperar no nosso País. Uma certa cerimônia não pessoal, mas uma cerimônia institucional, uma cerimônia em que as palavras não sejam propagadoras do mal-estar entre os brasileiros, mas, ao contrário, que sejam propagadoras da pacificação, da paz, da harmonia, da solidariedade, da moderação, do equilíbrio entre todos os brasileiros.

Tudo o que disse, meus amigos, faz parte de um ideário que ofereço ao País, não em busca da unanimidade, o que é impossível, mas como início de diálogo com busca de entendimento. Farei muitos outros pronunciamentos. E meus ministros também. Meus ministros é exagerado, são ministros do governo. O presidente não tem vice-presidente, não tem ministro, quem tem ministro é o governo. Então, os ministros do governo farão manifestações nesse sentido, sempre no exercício infatigável de encontrar soluções negociadas para os nossos problemas. Temos pouco tempo, mas se nos esforçarmos, é o suficiente para fazer as reformas que o Brasil precisa.

E aí, meus amigos, eu quero dizer, mais uma vez, da importância dessa harmonia entre os Poderes, em primeiro lugar. Em segundo lugar, a determinação, na própria Constituição - e eu a cumprirei - no sentido de que cada órgão do Poder tem as suas tarefas: o Executivo executa, o Legislativo legisla, o Judiciário julga. Ninguém pode interferir em um ou outro poder por uma razão singela: a Constituição diz que os poderes são independentes e harmônicos entre si.

Ora, bem, nós não somos os donos do poder, nós somos exercentes do poder. O poder, está definido na Constituição, é do povo. Quando o povo cria o Estado, ele nos dá uma ordem: "Olha aqui, vocês, que vão ocupar os poderes, exerçam-no com harmonia porque são órgãos exercentes de funções". Ora, quando há uma desarmonia, o que há é uma desobediência à soberania popular, portanto há uma inconstitucionalidade. E isso nós não queremos jamais permitir que se pratique.

Dizia aos senhores que a partir de agora nós não podemos mais falar em crise. Trabalharemos. Aliás, há pouco tempo, eu passava por um posto de gasolina, na Castelo Branco, e o sujeito botou uma placa lá: "Não fale em crise, trabalhe". Eu quero ver até se consigo espalhar essa frase em 10, 20 milhões de outdoors por todo o Brasil, porque isso cria também um clima de harmonia, de interesse, de otimismo, não é verdade? Então, não vamos falar em crise, vamos trabalhar.

O nosso lema - que não é um lema de hoje -, o nosso lema é Ordem e Progresso. A expressão da nossa bandeira não poderia ser mais atual, como se hoje tivesse sido redigida.

Finalmente, meus amigos, fundado num critério de alta religiosidade. E vocês sabem que religião vem do latim religio, religare, portanto, você, quando é religioso, você está fazendo uma religação. E o que nós queremos fazer agora, com o Brasil, é um ato religioso, é um ato de religação de toda a sociedade brasileira com os valores fundamentais do nosso País.

Por isso que eu peço a Deus que abençoe a todos nós: a mim, à minha equipe, aos congressistas, aos membros do Poder Judiciário e ao povo brasileiro, para estarmos sempre à altura dos grandes desafios que temos pela frente.


Meu muito obrigado e um bom Brasil para todos nós."

Vamos guardar estas palavras e acompanhar o seu desenvolvimento ao longo dos próximos meses.

Mentiras até o último minuto

Ela mente. Mente muito. Todo o tempo!
Fiel seguidora de uma ideologia que faz da mentira descarada e renitente um meio “legítimo” para atingir os fins, Dilma Rousseff manteve-se coerente até o seu afastamento temporário da Presidência: continuou a agredir a inteligência dos homens de bem do País, oferecendo-lhes uma versão delinquente dos fatos, com o objetivo de passar à história como pobre vítima de uma tramoia golpista. Felizmente, tal versão só encontra guarida entre aqueles militantes sectários do lulopetismo ou os que estão desesperados ante a perspectiva de perderem sua boquinha – uma minoria insignificante. A maioria da população do País que trabalha e está cansada da malandragem retórica dos petistas quer apenas seguir adiante, deixando para trás o caos criado pelas fantasias do chefão Lula e de sua patética pupila.

No pronunciamento que fez ontem no Palácio do Planalto, Dilma tornou a invocar os 54 milhões de votos que recebeu, como se estes, por si, fossem a garantia absoluta daquilo que chama de sua “legitimidade”. Segundo a petista, Michel Temer, que assumiu a Presidência interinamente, fará o “governo dos sem-voto”.

Trata-se de grosso embuste. Temer foi companheiro de chapa de Dilma nas eleições de 2010 e 2014, sendo decisivo em ambas as campanhas ao pôr em funcionamento a formidável máquina eleitoral do PMDB para obter os votos que deram a vitória à petista – os mesmos votos que ela diz que são só dela. Mas Dilma foi adiante e disse que um governo Temer “não terá legitimidade para propor e implementar soluções para os desafios do Brasil”. Tal conclusão, proferida por uma chefe de governo que não consegue o apoio nem de um terço do Congresso e que enfrentou manifestações de rua em razão de sua incapacidade política e administrativa, soa como escárnio.

Como se fosse uma líder democrata lutando contra uma tirania, Dilma incitou seus defensores a se mobilizarem nas ruas e insinuou que o governo Temer “pode se ver tentado a reprimir os que protestam contra ele”. Eis aí mais uma fraude típica do cardápio de artimanhas petistas. Em primeiro lugar, é dever das autoridades de segurança pública conter manifestações de rua que ferirem o direito de quem delas não participa, conforme o que prevê a lei. Em segundo lugar, um governo Temer não teria como reprimir nada, pois a manutenção da segurança pública é tarefa dos governos estaduais. Mas nada disso interessa. O que importa aos petistas, como sempre, é criar tumulto e com isso alimentar sua propaganda.

Dilma disse também que seu governo foi alvo de “incessante sabotagem” dos opositores, a quem responsabiliza pela criação de um “estado permanente de instabilidade política, impedindo a recuperação da economia com um único objetivo: tomar à força o que não conquistaram nas urnas”. 

Dilma quer fazer acreditar que a corrupção entranhada na administração pública, os dois anos de recessão, o desemprego que atinge mais de 10 milhões de trabalhadores, a alta da inflação, a perda de credibilidade internacional e o rombo nas contas públicas não são resultado de sua inépcia, mas de uma conspirata da oposição para derrubá-la.

Por fim, Dilma, a exemplo do que fizera Fernando Collor de Mello quando sofreu impeachment, em 1992, queixou-se da “dor da traição”, referindo-se, é claro, a Temer. Collor creditou seu afastamento a um “complô” dos deputados que antes o apoiavam, e não ao formidável escândalo de corrupção que protagonizou. Do mesmo modo, Dilma entende que está sendo afastada não pela série de crimes de responsabilidade que cometeu – e aqui nem se está falando da rombuda corrupção em seu governo e em seu partido –, mas sim porque seu vice tramou para tomar dela o poder.


No entanto, do mesmo modo que Collor traiu os que confiaram a ele a honra de ser o primeiro presidente eleito pelo voto direto depois do regime militar, é Dilma quem trai os milhões de eleitores que acreditaram em suas promessas de prosperidade e bem-estar social. O impeachment, portanto, é e continuará a ser a punição adequada para quem fez da irresponsabilidade e da burla um método de governo.

O Estado de São Paulo, 13/5/2016

quinta-feira, 12 de maio de 2016

MISSÃO CUMPRIDA!


Hoje acordo com a sensação de missão cumprida.
Durante 5 anos e meio lutei, com todas as forças que tinha e com todas as armas que dispunha, para tirar o partido político mais criminoso da história brasileira, do poder.
Participei em todas as demonstrações, expus minha indignação e registrei o meu protesto contra os atos criminosos de políticos que tentaram durante mais de 13 anos, transformar o Brasil em uma Venezuela, em uma Cuba.
Como em 1964, me entrincherei, pronto para a luta física se necessário fosse.
Mas as armas para combater esta espúria política não careceram de munição explosiva nem perfurante. A metralha escrita, falada e demonstrada no Facebook , aqui no meu blog e nas conversas com todas as pessoas que se dispunham a me ouvir, foram suficientes.
Tenho consciência que minha contribuição ao processo de combate à esta corja maligna que dominou, como um câncer, a política brasileira nesta última década, foi só uma gota dágua no oceano de dezenas de milhões de pessoas. Mas me sinto como se fosse o mais importante Almirante nesta batalha naval para o salvamento da nação que espero deixar para os meus netos.
A guerra, iniciada nas trincheiras da política estudantil no idos de 1960, tem um ápice neste momento.
Sim, política estudantil. Muito pouca gente sabe que fui líder estudantil em uma pequena cidade do Estado do Rio de Janeiro e que lutei contra a infiltração comunista nas escolas secundárias, já em 1962!
São 54 anos lutando, como pude e como posso, contra uma fisolofia política autoritária e ditatorial, que já matou mais de 100 milhões de pessoas em 99 anos.
Estou satisfeito com o resultado e orgulhoso de ter contribuido para que a mais incompetente, arrogante, estúpida, imbecil e desonesta pessoa a ocupar o mais elevado cargo público do Brasil, fosse impedida.
Aos milhares de amigos e conhecidos que me apoiaram e incentivaram com suas curtidas e comentários, muito obrigado.

terça-feira, 10 de maio de 2016

O impeachment não pertence a Cunha, Temer ou à oposição


Na biografia que Lira Neto escreveu de Getulio Vargas, é impactante ver como o ditador acalentou a própria morte por 20 anos. Ao contrário do que sustentam seus adoradores, o ato irreversível não foi consumado por alguém torturado pelas pressões dos adversários. A tortura de Vargas era a perda do poder – a desonra inadmissível – e o suicídio foi determinado pela alma tirânica de quem não suportava viver sem mandar.

Dilma Rousseff se diz vítima de um golpe que não ousa denunciar em nenhum órgão internacional sério; vê-se alvo de “manhas e artimanhas” enquanto usa, para a defesa impossível, o advogado-geral da União que ataca a União; sente-se atingida pela conspiração de Michel Temer como se as prerrogativas institucionais do vice se submetessem às conveniências dela; choraminga a vingança de Eduardo Cunha como se ele votasse por 513 deputados – enfim, Dilma é torturada pela expectativa de perder o poder, inadmissível para a mulherzinha autoritária.

Há alguns dias, circularam notícias de que a presidente, negando a realidade enquanto rumina tais confusões, planejava um ato grandiloquente. E, como não se trata de uma figura com a lucidez trágica de Vargas, mas apenas de uma fraude tosca, grandiloquência obriga ao ridículo, patético ou apenas idiota: Dilma Rousseff se acorrentaria à cadeira de presidente. Ora, a súcia acorrentou-se ao poder há 13 anos e, eleita, a czarina da roubalheira tornou-se elo das cadeias que atariam o PT ao poder por décadas. Quando milhões de indignados arrebentam o projeto odioso, a quem repele a democracia e estranha a dignidade, nada resta senão arrastar correntes entre balbucios delirantes de vigarice.

Enquanto não se parte a corrente de vez, no prolongamento dramático da agonia do país que tenta socorrer a meninazinha de olhos verdes que Quintana chamou de esperança, o PT e comparsas seguem fazendo política como a entendem: forçando o Brasil a perder mais tempo, dinheiro, credibilidade dos investidores e algum remanescente respeito internacional para que a súcia ganhe umas horas a mais acorrentada e, assim, o aberrante Waldir Maranhão despontou para o vexame planetário e a cassação tardia.

Com uma rápida consulta às normas da Câmara, descobre-se que o anúncio da anulação do impeachment, na dublagem do grotesco presidente interino, seria o maior disparate em 190 anos de história daquela Casa. Mas e daí? Se a súcia reconhecesse leis, competência, decoro ou honestidade, não teria trazido o país à desolação.

Pleno de equívocos técnicos e morais, o ato bisonho escancara o gozo perverso desses cafajestes xexelentos asfixiando o país para não romperem as correntes com o poder e é a cena sem cortes, o nu frontal, do que tramaram Ricardo Lewandovski e Marco Aurélio, no STF, se Teori Zavascki não tivesse se antecipado para suspender o mandato de Eduardo Cunha e afastá-lo da presidência da Câmara. A exótica dupla togada se preparava para acatar recurso que ensejaria o pedido de cancelamento das sessões para a admissibilidade do impeachment.


Olhem aqui, súcia e simpatizantes, tirem a mão desse impeachment, ele não pertence a Cunha, Temer ou à oposição: ele é meu; é seu; é de milhões de indignados. Essas e outras ciladas avisam que a meninazinha de olhos verdes – não esqueçamos, adverte o poeta, o nome dela é esperança – continuará ameaçada e é preciso que os indignados se reúnam em torno dela na calçada para protegê-la da tirana que arrasta correntes.

Augusto Nunes, 10/05/2018

sábado, 7 de maio de 2016

SEXTA 13, DIA SEM BRUXA


Guilherme Fiuza

Os democratas que defendem Dilma e a quadrilha do petrolão contra o golpe de Sérgio Moro estão discretamente eufóricos. Os tanques da direita, que vieram arrancar a presidenta mulher à força do palácio, resolverão todos os seus problemas. Estava desconfortável (e, o que é mais grave, trabalhoso) esse negócio de ser governo.

Foram anos de sofrimento para continuar do contra, sendo a favor. Foi preciso instaurar o primeiro governo de oposição da história – e não pensem que isso é fácil. Aumentar os juros e gritar contra os juros altos, roubar o Estado e denunciar a corrupção, devastar a economia popular e defender o povo… Isso cansa uma pessoa.

Mas deu tudo certo: após 13 anos e meio de poupança ortodoxa, com propinas por fora e por dentro, valerioduto e pixulecos garantindo o formidável abastecimento do caixa partidário, chegou a hora de desfrutar. A elite vermelha volta para o presépio dos oprimidos, gorda e rica, só para jogar pedras – o que faz um bem danado à alma progressista e quase não suja as mãos. Mas eis que surge o revés inesperado.

Quando os professores de História já abrilhantavam suas aulas-comício, inserindo o golpe contra os imaculados parasitas para entregar o Brasil ao PMDB de Eduardo Cunha, viraram a mesa. Num ato sem precedentes, o Supremo Tribunal Federal destituiu o presidente da Câmara dos Deputados. Cunha caiu. E agora?

Foi um golpe duro demais para os democratas. É verdade que eles ainda têm o Bolsonaro, a PM de São Paulo, o Trump e a Guerra do Vietnã, mas a perda de um Eduardo Cunha não se repõe facilmente. Quem o STF pensa que é para cometer uma arbitrariedade dessas? Como os homens de bem farão, a partir de agora, para defender Lula – e todos os seus crimes progressistas denunciados pelo procurador-geral – sem poder gritar que bandido é o Cunha? A Anistia Internacional não está vendo isso?

O Prêmio Nobel da Paz está. Pelo menos um dos seus detentores, o escritor argentino Adolfo Pérez Esquivel, parceiro de Cristina Kirchner, Nicolás Maduro e toda essa turma boa que ama a democracia (amor infelizmente não correspondido). Pérez Esquivel fez história no Senado brasileiro ao denunciar o golpe de Estado contra Dilma Rousseff. E atenção: o golpe foi executado por Eduardo Cunha, o mau. Quem sabe até o seu afastamento agora não foi uma espécie de queima de arquivo?

Aí vem o relator da comissão do impeachment, naquela mesma bancada onde um Nobel da Paz fez história, e expõe de forma monótona, sem um pingo de glamour, todos os crimes cometidos por Dilma Rousseff no exercício da Presidência da República. Esse aí nunca vai ganhar um Nobel. Além de tudo, é estraga-prazeres: mostrou de forma absolutamente desagradável que Eduardo Cunha não tem nada a ver com o impeachment – apenas o colocou em votação. A Anistia Internacional não está vendo isso?

Nos dois anos de literatura da Lava-Jato, entende-se de onde vieram os bilhões de reais que bancam há anos os advogados mais caros do país para os guerreiros do povo brasileiro; que bancam há anos as campanhas eleitorais nababescas pelas quais o PT se tornou o feliz proprietário dos Três Poderes; que compraram movimentos sociais (sic), entidades de classe, jornalistas com indignação tabelada, espalhadores de boatos e manifestantes profissionais. Mas nada é tão poético quanto um pedido de propinas retroativas – atribuído ao companheiro Ricardo Berzoini pelo ex-presidente da Andrade Gutierrez.

Segundo Otavio Azevedo, o então presidente do PT e atual ministro da golpeada e oprimida Dilma avisou, em 2008, que a empreiteira deveria pagar propinas sobre as obras feitas desde 2003 (ano em que o Brasil foi redescoberto). O apetite dos representantes desse governo progressista é conhecido, vide seus tesoureiros presos e o envolvimento de todos – todos – os seus principais líderes em negociatas democráticas e revolucionárias. A conta é a seguinte: quem foi mais importante na construção heroica da atual pindaíba nacional? A gangue do Lula ou a do Eduardo Cunha?

Quem acertar ganha um Nobel da Paz e meio quilo de mortadela.

Da última vez em que o Brasil viveu um impeachment, o governo passou às mãos de um presidente filiado ao PMDB. O que se impôs, então, não foi uma orgia fisiológica – foi o Plano Real. Itamar Franco foi obrigado pela ruína política e econômica a dar poder ao Brasil que trabalha. Michel Temer está na mesma situação.

Os prognósticos apontam para a sexta-feira 13 o fim da agonia. Descerá a rampa, então, a criatura que Lula inventou para tomar conta da porta, enquanto eles limpavam a casa. Uma criatura que os brasileiros incrivelmente engoliram – mesmo que, diante dela, um Tiririca seja praticamente um Churchill. Tchau, querida.


A parada agora é entre o Brasil que trabalha e o Brasil que atrapalha.
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