domingo, 30 de novembro de 2014

O PT vai finalmente expulsar Dirceu?


 O PT roubou só um “pouquinho”…
Ao ler a notícia hoje de que o Diretório Nacional do PT aprovou a expulsão de seus membros comprovadamente envolvidos em corrupção (mas não de imediato), fiquei com a sensação de déjà vu e fui me certificar de que não pegara um jornal de uma década atrás. Como assim? Eu poderia jurar que o estatuto do PT já contemplava tal expulsão para corruptos!

“Manifestamos a disposição firme e inabalável de apoiar o combate à corrupção. Qualquer filiado que tiver, de forma comprovada, participado de corrupção, deve ser expulso”, diz trecho. Bem, deixando de lado essa questão de que a coisa já era assim antes e não fica claro ao certo o que mudou, resta perguntar: então José Dirceu vai finalmente ser expulso do PT e não mais receber aplausos emocionados sob o grito de “guerreiro nacional”?

Quer comprovação maior do que ser condenado pelo STF após todos os devidos processos legais e chances quase inesgotáveis de apelação? “Se há algum envolvimento, quero saber se as denúncias são comprovadas ou não. Todos têm direito a defesa e contraditório. Reafirmo que se alguém estiver envolvido, não ficará no PT”, disse Rui Falcão, presidente do PT. Mais direito a defesa do que teve Dirceu, Delúbio e companhia? No entanto, não vamos esquecer que nem William Bonner nem Aécio Neves conseguiram arrancar de Dilma sequer sua opinião sobre a condenação dos companheiros…

Tudo isso é uma grande piada de mau gosto. As coisas que o PT fala, escreve e faz são para “inglês ver”, ou mais precisamente para “inocente útil brasileiro ver”. Todo o esforço do partido vai na direção de simular que os escândalos que arrastam os seus na lama se devem a fatores exógenos, ao sistema político, ao financiamento privado de campanha, e que ele faz de tudo para combater tal corrupção.

O pior é que ainda tem gente que acredita! Como escreve Guilherme Fiuza em sua coluna da “Época” desta semana, um tanto incrédulo, surge em meio às vozes que defendem Dilma e o PT para se sentir progressistas “o postulado central para tentar salvar o pescoço do governo: relativizar a corrupção da Petrobras”.

Pessoas que se acham sérias e não estão (ainda) a soldo do petismo repetem que o ocorrido na maior estatal do país foi algo “normal”, que sempre ocorreu antes. O foco dos petistas em debater a “reforma política” e proibir o financiamento privado de campanha visa justamente a essa tática: jogar para ombros alheios o que o partido fez, e tratar tudo como parte natural da política brasileira.

O mesmo recurso usado por Lula no mensalão ao falar de caixa dois, o que “todos fazem”. Um empresário que se disse tucano chegou ao absurdo de escrever em um artigo na Folha que hoje se rouba até menos na Petrobras que no passado. Música para os ouvidos dos petistas e dos inocentes úteis que desejam fechar os olhos para a realidade para preservar a sensação de defensores dos pobres e oprimidos (só porque apertaram 13 nas urnas). Diz Fiuza:

Vamos explicar aos ignorantes ou mal-intencionados (a esta altura, dá no mesmo): o PT não ficou igual aos outros; o PT não é corrupto como os outros, nem um pouco menos, nem um pouco mais; o PT é o único, sem antecessor na história do Brasil, que montou um sistema de corrupção no Estado brasileiro, de dentro do Palácio do Planalto, para enriquecer o partido e se eternizar no poder.

Como alguém ainda não se deu conta disso é, para mim, um espanto. José Dirceu, o ex-ministro de Lula e homem forte do ex-presidente, foi preso não por corrupção “apenas”, mas por montar um duto entre as estatais e o caixa do partido, privatizando o dinheiro dos “contribuintes” para alimentar o projeto autoritário de poder do PT. O mesmo se deu na Petrobras, sem nenhum tipo de receio da quadrilha após o mensalão vir à tona. Fiuza pergunta:

Deu para entender, queridos inocentes úteis? O roubo não é a velha esperteza de uns oportunistas com cargos na máquina. O roubo é um projeto político de poder. Que, aliás, graças a seres compreensivos como vocês, dá certo há 12 anos. [...] Vocês estão esperando o quê? Que um companheiro bata na sua porta informando-lhe com ternura que veio buscar suas calças?

Parece que é exatamente aquilo que alguns esperam. Fiuza é até obsequioso ao chamá-los de “inocentes úteis”. São aqueles que vão aplaudir as “mudanças” aprovadas no PT para, agora, expulsar os corruptos. Mas não imediatamente. Afinal, ninguém precisa ser tão duro assim com esses pobres heróis injustiçados, que tentam apenas melhorar a vida dos oprimidos em um sistema cruel que os obriga a desviar recursos públicos…


Rodrigo Constantino

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Rosegate


O Brasil decente achou muito boa a notícia que tirou o sono do parceiro de Rose

“Neste país, as notícias ruins são manchetes e as boas saem pequenininhas”, vive resmungando Lula. Depende do olhar de quem lê ou da folha corrida de quem lê. Neste domingo, por exemplo, o site de VEJA informou que continua longe do desfecho judicial o escândalo descoberto em 23 de novembro de 2012 pelos policiais federais engajados na Operação Porto Seguro. A impunidade da quadrilha que forjava pareceres de órgãos federais para apressar a liberação de obras irregulares executadas por empresários malandros é uma notícia ruim para os brasileiros decentes. Mas muito boa para Lula.

Ele gostou de saber que, graças ao andar preguiçoso do caso na Justiça, tão cedo não se juntarão num banco dos réus os delinquentes de estimação que ampliaram consideravelmente o volume de negociatas depois do ingresso no bando de Rosemary Nóvoa de Noronha, a Rose. Entre 2004 e 2010, a mulher que costumava apresentar-se como “namorada do Lula” até a gente que acabara de conhecer acumulou o posto de segunda-dama da República Lulopetista com o cargo de chefe do  escritório da Presidência em São Paulo.

Deu-se o contrário em 13 de novembro, quando o site do Superior Tribunal de Justiça divulgou o que foi uma ótima notícia para gente honesta e péssima para Lula: “O STJ acolheu o pedido da Infoglobo e do jornalista Thiago Herdy Lana para terem acesso aos gastos efetuados com o cartão corporativo do governo federal utilizado por Rosemary Nóvoa de Noronha, com as discriminações de tipo, data, valor das transações e CNPJ/razão social”. Thiago Herdy só recorreu ao STF depois de buscar inutilmente essas informações na Secretaria de Comunicação Social da Presidência.

Em resposta à solicitação, o órgão limitou-se a liberar a planilha que registra, sem discriminá-los, os gastos efetuados por Rosemary Noronha entre 2003 e 2011. Para o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator do caso no STJ, a esperteza da Secretaria de Comunicação Social configurou uma “violação ilegal do direito líquido e certo da empresa e do jornalista de terem acesso à informação de interesse coletivo”. Segundo Maia Filho, o pleno acesso aos extratos que detalham a gastança “é assegurado pela Constituição e regulamentado pela Lei  de Acesso à Informação”.

Além do valor de cada transação, logo se saberá onde, quando e para quê a mulher que se apresentava aos comparsas como “namorada do Lula” sacou da bolsa o cartão corporativo do governo federal que ganhou junto com o empregão no escritório presidencial. As esquivas do Planalto, o sumiço de Rose e o silêncio do parceiro fortalecem a suspeita de que é de bom tamanho o teor explosivo das informações ainda secretas. Todas, admita-se, são menos graves que as evocadas pelo Ministério Público para denunciar Rose por formação de quadrilha, corrupção passiva, tráfico de influência e falsidade ideológica.

Mas, contempladas por Lula, decerto parecerão mais constrangedoras e desmoralizantes. Conjugadas, vão confirmar que o caso Rose é o primeiro escândalo que o ex-presidente que nunca sabe de nada está impedido de terceirizar, ou enterrar na cova rasa onde jazem os muitos casos de polícia que o chefe debitou na conta dos chefiados. Não houve intermediários entre Luiz Inácio e Rosemary. Foi ele quem instalou a segunda-dama no comando do escritório presidencial que acabaria reduzido a sucursal de quadrilha. Foi ele quem fantasiou de mãe-da-pátria uma soberba nulidade.

Também foi ele quem ordenou a Dilma que mantivesse no cargo a vigarista de estimação. Foi ele quem presenteou a companheira com 23 viagens internacionais a bordo do Aerolula. Foi ele quem transformou delinquentes amigos da amiga em diretores de agências reguladoras. Foi ele quem confundiu interesses públicos com prazeres privados. Foi ele, enfim, o protagonista da chanchada porno-política que produziu, como constata a postagem reproduzido na seção Vale Reprise, pelo menos 40 perguntas à espera de respostas ou álibis que não há.

“Inexiste justificativa para manter em sigilo as informações solicitadas, pois não se evidencia que a publicidade de tais questões atente contra a segurança do presidente e vice-presidente da República ou de suas famílias”, liquidou a questão o relator Maia Filho. “A divulgação dessas informações seguramente contribui para evitar episódios lesivos e prejudicantes”. Pena que a decisão do STJ tenha sido confinada nos centímetros que sobraram nas editorias de Política & Polícia inundadas pelas bandalheiras do Petrolão.

Para quem respeita a lei, foi uma ótima notícia. Merecia manchete.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Chantagem


Aliados chantageiam Dilma escancaradamente

O que assusta na marcha resoluta de Dilma Rousseff rumo ao arcaico é sua crueza explícita. Se a sessão mais recente do Congresso serviu para alguma coisa foi para informar à presidente reeleita que ela não deve esperar nenhuma colaboração altruísta dos seus aliados. Ficou entendido que, no segundo mandato, os sócios do empreendimento governista enquadrarão a presidente da República em três leis: a lei da oferta e da procura, a lei do mais forte e a lei da selva.

O fato de os partidos aproveitarem a hora para exigir definições sobre o rateio dos ministérios e otras cositas não deveria surpreender o Planalto. O pessoal está apenas exigindo a consideração que Dilma não demonstrou no primeiro mandato, quando ainda se achava uma gerente extraordinária. A presidente encomendou uma meia-sola para disfarçar o rombo nas contas de 2014. Os aliados querem ajudar. Mas exigem recompensa compatível com o valor do conserto —são regras do mercado persa.

Renan Calheiros reuniu-se com Dilma na terça-feira. Acertou o envio do senador Vital do Rêgo, PhD em gestão de CPIs, para uma sinecura no TCU. E prometeu apressar a aprovação do jeitinho fiscal. Renan ligou o trator. Numa única noite, arou os 38 vetos presidenciais que obstruíam a passagem da manobra que transformará deficit em superavit. Programou o grand finale para o dia seguinte, na hora do almoço. Foi mastigado pela oposição e engolido pelo seu PMDB.

Chamado de “vergonha do Congresso” por Mendonça Filho, líder do DEM, Renan tentou fingir que havia quórum para manter o funcionamento da sessão. Para entregar a mercadoria a Dilma, precisava dos votos de 257 deputados e 41 senadores. Mas passaram pelo plenário apenas 222 dos 513 deputados e 32 dos 81 senadores. Em plena quarta-feira, dia de Casa cheia, não se chega a uma falta de quórum como essa na base do improviso.

A bancada do PMDB na Câmara soma 71 deputados. Passaram pela sessão 28. Ausente, o líder Eduardo Cunha atribuiu o fenômeno à hora do almoço. Ele mesmo estava num repasto com a turma do PSC, que irá apoiá-lo na briga pela presidência da Câmara. No Senado, o PMDB controla 19 cadeiras. Apenas oito estavam ocupadas. Foi como se os peemedebistas gritassem para Dilma que Renan representa os interesses dele, não as reivindicações das bancadas.

Além do PMDB, estavam sub-representados na sessão do Congresso outras legendas cujo governismo anda meio cansado, dependendo de uma vitamina para revigorar-se. O PP, por exemplo, desfilou no plenário apenas 23 cabeças. O PR, 17. E o PSD, 26. Reduzido à rara condição de general sem tropa, Renan reconheceu a ausência de infantaria, enfiou a empáfia no saco, encerrou os trabalhos  e convocou nova batalha para terça-feira, já em pleno mês de dezembro, a 20 dias do recesso parlamentar.

Na semana passada, Dilma adiara o anúncio de sua nova equipe econômica porque lhe disseram que seria possível apresentá-los ao mercado já com a página do buraco nas contas virada pelo Congresso. Deu chabu. Nesta quinta, Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) virão à boca do palco tendo como pano de fundo a nódoa da meta descumprida do superavit. Por um instante, serão coadjuvantes de um enredo que tem a chantagem como protagonista.

Tramada e executada com esmero, a ausência de governistas na sessão do Congresso foi uma mensagem do lado mais forte para o mais fraco. E no Brasil de Brasília, os partidos governistas chegaram à conclusão de que o lado politicamente mais fraco é a presidente da República que acaba de ser reeleita. Chantageada assim, à luz do dia, Dilma terá de decidir rapidamente que tipo de papel deseja desempenhar nos próximos quatro anos: presidente ou refém?


quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Petrossauro


Roberto Campos chamava a Petrobrás de “Petrossauro”, e despertava a fúria dos nacionalistas, tanto de esquerda como de direita. Criaram a alcunha de “Bob Fields” para descrever o “entreguista”, aquele que, ó céus!, estava disposto a vender nosso maior patrimônio para os gringos, até mesmo ianques (cruzes!), em vez de compreender que “o petróleo é nosso”.

Campos compreendia muito bem, na verdade, que o petróleo é sempre “deles”, dos que estão no poder. E sabia, também, da típica incompetência do estado como gestor, let alone a corrupção. Por isso lamentava, quase exasperado, quando os tucanos, vistos como “neoliberais” por nossa esquerda jurássica (risos), faziam de tudo para impedir a privatização da Petrobras.

Na já famosa entrevista no Roda Viva em 1997, em que Campos dá uma boa esculachada em Marco Aurélio “Top Top” Garcia, eis o que ele diz sobre o assunto:

“Há uma exceção gritante na paisagem brasileira. O próprio Fernando Henrique – e por isso ele não pode ser acusado de neoliberal, um neoliberal jamais faria isso – ele próprio apresentou um projeto de lei vedando a privatização da Petrobras. Ele podia silenciar sobre o assunto, deixando que a evolução dos acontecimentos ditasse o melhor rumo. Afinal de contas, nós abolimos o monopólio na Constituição. Isso permitiria até a privatização da Petrobras se ele quisesse. Ele se apressou em assumir um compromisso pessoal, e eu espero que seja válido só durante o tucanato, de não privatizar a Petrosal, Petrobras, o que seja. Isso foi, a meu ver, uma imprudência porque o Brasil pode precisar privatizar a “Petrossauro” por motivos fiscais e por motivos cambiais. Afinal de contas, hoje o petróleo continua sendo o item mais pesado na nossa pauta de importação. E os esforços da “Petrossauro” estão longe de nos assegurar a auto-suficiência, estamos correndo para ficar parados. Nós importamos no ano passado 610 mil barris, que era exatamente o que importamos quando da primeira crise de petróleo. Estamos correndo para ficar parados.”

De fato, continuamos longe da autossuficiência, importando derivados de petróleo com grande rombo nas contas externas, e a Petrobrás acabou privatizada, só que da pior forma possível: usurpada por uma quadrilha que desviou mais de R$ 10 bilhões de seus cofres!

E o que fazem os tucanos hoje? O deputado Otávio Leite, do Rio, tem um projeto de lei que pretende tornar impossível a privatização da Petrobras. Ou seja, não só se recusam a trazer para o debate o cerne da questão – o fato de que a estatal sempre correrá o risco de ser capturada por um partido e seus apaniguados corruptos – como ainda repudia qualquer alternativa de mercado. E o PSDB é “acusado” de ser “neoliberal” pelos petistas!

Que falta nos faz um Roberto Campos…


Rodrigo Constantino

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Projeto de poder banaliza corrupção


Projeto de poder banaliza corrupção
Editorial de O Globo, em 25/11/2014

À luz do mensalão e, agora, do petrolão, pode-se dizer, dentro de uma perspectiva histórica, que não é por mera coincidência que, em doze anos de lulopetismo no Planalto, construiu-se o mais articulado e amplo esquema de corrupção na máquina pública de que se tem notícia, a fim de drenar dinheiro de estatais para financiar um projeto de poder.

Não é por acaso que em 2004, enquanto o mensalão, cujo embrião está na campanha eleitoral de 2002, já funcionava a contento, o "amigo Paulinho" — como o presidente Lula tratava Paulo Roberto da Costa —, funcionário da Petrobras, era nomeado diretor de Abastecimento da estatal, indicado pelo PP do deputado José Janene (PP-PR), este também um mensaleiro. O nome saído do bolso do colete do aliado Janene foi bem aceito pelo lulopetismo. Falecido, Janene não pode colaborar com as investigações do petrolão, do qual o seu apadrinhado foi peça-chave, pelo que já se sabe de depoimentos do próprio ex-diretor da Petrobras prestados sob acordo de delação premiada. Não se discute se houve um assalto bem organizado aos cofres da Petrobras patrocinado por diretores — algo tão extraordinário que acionou os mecanismos americanos de vigilância do mercado de títulos do país, usado pela Petrobras como fonte de capitalização, para também investigar o escândalo e buscar responsáveis. Não se discute porque o próprio “amigo Paulinho” se declara culpado e, para reduzir penas, compromete-se a ajudar na elucidação do caso.

Lulopetistas costumam defender o partido, desde a descoberta do mensalão, em 2005, com a surrada justificativa de que "todos fazem". É a escapatória da banalização do crime, para tentar reduzir sua gravidade. A própria candidata Dilma Rousseff escorregou na campanha da reeleição ao dizer que há corruptos em todos os lugares. Fez lembrar o presidente Lula, na histórica entrevista em Paris, depois que o então aliado Roberto Jefferson (PTB-RJ) denunciou o mensalão, quando afirmou que o PT fez o que todo partido fazia.

O mensalão foi desbaratado, informações colhidas por CPI, pela PF e Ministério Público instruíram um processo julgado de forma exemplar pelo Supremo, de que resultou a prisão de petistas estrelados: o ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoíno e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares. Além de aliados e cúmplices.

Pois agora, no petrolão, Mario Oliveira Filho, advogado de Fernando Soares, o “Fernando Baiano”, acusado de operar — verbo usado em sentido malicioso no submundo da política —na Petrobras, em nome do PMDB, segue na trilha da banalização e diz que não se consegue obra pública sem propinas. Tenta-se jogar areia nos olhos da opinião pública. Não há uma corrupção aceitável e outra reprovável. Há o crime de malversação do dinheiro público a ser investigado e punido. Os casos do mensalão e petrolão — delinquências de mesma célula-tronco — mostram um padrão de drenagem do dinheiro do contribuinte. São malhas tecidas entre partidos e políticos, estatais, empreiteiras, empresas públicas, sindicalistas e, conforme mostrou o GLOBO no fim de semana, fundos de pensão de empresas públicas, tudo numa dimensão jamais vista no submundo da política brasileira, tendo como objetivo estratégico um projeto de perpetuação no poder. É claro, com os inexoráveis desvios feitos para enriquecimento particular. Afinal, a carne é fraca.


O mensalão mostrou apenas a ponta de uma máquina avantajada de corrupção que agora fica mais visível à medida que avança a investigação sobre o esquema na Petrobras, com suas diversas conexões, como a dos fundos de pensão Não se trata de um crime sem implicações. O próprio estado de direito democrático ficou ameaçado, pois o plano visa a comprar apoio no Legislativo e se perpetuar no Executivo pelo voto capturado por políticas populistas. Mas não se contava com o vigor de instituições republicanos brasileiras.

A meia-verdade do pedágio


A meia-verdade do pedágio
O ESTADO DE S.PAULO
24 Novembro 2014 

No afã de defender um cliente, principalmente quando as suspeitas levantadas contra ele não parecem descartáveis, às vezes um advogado cede à tentação de diluir perante a opinião pública a presumível responsabilidade por ilícitos penais de quem o contratou com o argumento de que ele, se não fosse inocente, de forma alguma seria o único a merecer as atenções da Justiça. Em português corrente, equivale a dizer, com ar de desafio: "Sou, sim, mas quem não é?". Tome-se o caso do patrono do cidadão Fernando Soares, o lobista profissional mais conhecido como Fernando Baiano.

Ele foi apontado nas delações premiadas do ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa e de seu comparsa, o doleiro Alberto Youssef, como intermediário no esquema de pagamento de propinas por empresas interessadas em negócios com a Petrobrás. Trabalharia para o PMDB, o que o partido negou enfaticamente. Um dos 24 suspeitos de participar do escândalo, cuja prisão foi decretada pelo juiz federal Sérgio Moro, estava foragido desde o dia 14. Terça-feira, entregou-se à Polícia Federal no Paraná. O criminalista que o representa, Mário de Oliveira Filho, alega ter outra avaliação do "empresário".

Os atos de seu cliente seriam os de alguém "que descobre um problema de infraestrutura e vai atrás da empresa que tem a solução, recebendo uma porcentagem absolutamente legítima disso", afirma. Mas não exclui por definição a possibilidade de Soares ter feito uma "composição ilícita" com um político "para pagar alguma coisa". E aí Oliveira Filho desandou a dissertar sobre "a cultura política do País", da qual os empreiteiros encarcerados seriam vítimas. Isso porque, se o candidato a um negócio com a área pública não pagar pedágio aos políticos que fazem a ponte com a Administração, "não tem obra".

Caso alguém ainda não tivesse captado o espírito da coisa, aprofundou a sua teoria. "Pode pegar qualquer empreiterinha e prefeitura do interior do País", sugeriu. "Se não fizer acerto, não coloca um paralelepípedo no chão." A cobrança e o pagamento de pedágio seriam, portanto, verso e anverso da moeda única das relações entre o Estado e o setor privado. (Na mesma linha, o vice-presidente da construtora Mendes Júnior, Sérgio Mendes, disse à Polícia Federal que em 2011 teve de pagar R$ 8 milhões à dupla Costa & Youssef para conservar o contrato da obra da quinta maior refinaria brasileira, a Repar.)

Dito de outro modo, se a corrupção fosse inexorável como sustenta o advogado, associando-se a todos quantos supõem que o Brasil "não tem jeito", ou porque os brasileiros são assim mesmo ou assim é o Poder Civil, a sociedade já teria se desmanchado sob a força desagregadora da bandalheira endêmica. A corrupção, evidentemente, não é pouca nem concentrada. Mas tampouco se pode perder o senso de proporção. Leituras, ainda que infrequentes, do noticiário internacional bastariam para enxergar o Brasil em posição menos vexaminosa, por exemplo, do que a África do Sul, a China, a Índia e a Rússia - para citar, em ordem alfabética, nossos parceiros do Brics, deixando de lado os regimes cleptocráticos pelo mundo afora.

E o mais importante não é nem isso. Todos os dias úteis, dezenas de milhões de brasileiros voltam para as suas famílias depois de extenuante jornada de trabalho, sem que em algum momento durante os seus afazeres tenham se abrigado na fantasia pervertida de serem comprados para cometer um ilícito contra o patrão ou o governo. Não é por inveja que o homem da rua abomina quem corrompe e quem acede de bom grado a ser corrompido. E seria fazer pouco-caso de sua inteligência presumir que ele se deixa enrolar por alegações de grandes empresários como os alcançados pela Operação Lava Jato.


Afirmam em sua defesa, como o advogado Oliveira Filho em relação ao universo de seu cliente Fernando Soares, que são extorquidos pelos políticos e à extorsão se submetem, do contrário não sobreviveriam no mercado. É um caso antológico de meia-verdade. O pedágio de que eles não têm escapatória voltará aos seus cofres, com robustos acréscimos, mediante o superfaturamento dos contratos, em conluio com o contratante. Perdedor mesmo só há um: o contribuinte.

sábado, 22 de novembro de 2014

Apocalipse, agora!


APOCALIPSE, AGORA
Fernando Gabeira

Passada uma semana do juízo final, ainda me pergunto cadê a Dilma. Ela disse que as contas públicas estavam sob controle e elas aparecem com imenso rombo. Como superar essa traição da aritmética? Uma lei que altere as regras. A partir de hoje, dois e dois são cinco, revogam-se as disposições em contrário. Os sonhos de hegemonia do PT invadem a matemática, como Lysenko invadiu a biologia nos anos 30 na Rússia, decretando que a genética era uma ciência burguesa. A diferença é que lá matavam os cientistas. Aqui tenho toda a liberdade para dizer que mentem.

Cadê você, Dilma? Disse que o desmatamento na Amazônia estava sob controle e desaba sobre nós o aumento de 122% no mês de outubro. Por mais cética que possa ser, você vai acabar encontrando um elo entre o desmatamento na Amazônia e a seca no Sudeste.

Cadê você, Dilma? Atacou Marina porque sua colaboradora em educação era da família de banqueiros; atacou Aécio porque indicou um homem do mercado, dos mais talentosos, para ministro da Fazenda. E hoje você procura com uma lanterna alguém do mercado que assuma o ministério.

Podia parar por aqui. Mas sua declaração na Austrália sobre a prisão dos empreiteiros foi fantástica. O Brasil vai mudar, não é mais como no passado, quando se fazia vista grossa para a corrupção. Não se lembrou de que seu governo bombardeou a CPI. Nem que a Petrobrás fez um inquérito vazio sobre corrupção na compra de plataformas. A SBM holandesa confessou que gastou US$ 139 milhões em propina.

E Pasadena, companheira?

O PT está aí há 12 anos. Lula fez vista grossa para a corrupção? Se você quer definir uma diferença, não se esqueça de que o homem do PT na Petrobrás foi preso. Ele é amigo do tesoureiro do PT. A cunhada do tesoureiro do PT foi levada a depor porque recebeu grana em seu apartamento em São Paulo. De que passado você fala, Dilma? Como acha que vai conseguir se desvencilhar dele? A grana de suas campanhas foi um maná que caiu dos céus?

Um dos traços do PT é sempre criar uma versão vitoriosa para suas trapalhadas. José Dirceu ergueu o punho cerrado, entrando na prisão, como se fosse o herói de uma nobre resistência. Se Dilma e Lula, por acaso, um dia forem presos, certamente, dirão: nunca antes neste país um presidente determinou que prendessem a si próprio.

Embora fosse um fruto do movimento de arte moderna no Brasil, Macunaíma é um herói pós-moderno. Ele se move com desenvoltura num universo onde as versões predominam sobre as evidências.

Nesta primeira semana do juízo final, pressinto a possibilidade de uma volta ao realismo. É muito aflitivo ver o País nessa situação, enquanto robôs pousam em cometas e EUA e China concordam em reduzir as emissões de gases de efeito estufa. O realismo precisa chegar rápido para a equação, pelo menos, de dois problemas urgentes: água e energia. Lobão é o ministro da energia e foi citado no escândalo. Com perdão da rima, paira sobre o Lobão a espada do petrolão. Como é que um homem desses pode enfrentar os desafios modernos da energia, sobretudo a autoprodução por fontes renováveis?

Grandes obras ainda são necessárias. Mas enquanto houver gente querendo abarcar o mundo a partir das estatais, empreiteiras pautando os projetos, como foi o caso da Petrobrás, vamos patinar. O mesmo vale para o saneamento, que pode ser feito também por pequenas iniciativas e técnicas, adequadas ao lugar.

Os homens das empreiteiras foram presos no dia do juízo final. Este pode ser um caminho não apenas para mudar a política no Brasil, mas mudar também o planejamento. A crise hídrica mostra como o mundo girou e a gente ficou no mesmo lugar. Existe planejamento, mas baseado em regularidades que estão indo água abaixo com as mudanças climáticas.

O dia do juízo final não foi o último dia da vida. É preciso que isso avance rápido porque um ano de dificuldades nos espera. Não adianta Dilma dizer que toda a sua política foi para manter o emprego. Em outubro, tenho 30.283 razões para desmentir sua fala de campanha: postos de trabalho perdidos no período. Não será derrubando a aritmética, driblando os fatos que o governo conseguirá sair do seu labirinto.

O desejo de controlar a realidade se estende ao controle da própria oposição. O ministro da Justiça dá entrevista para dizer como a oposição se deve comportar diante do maior escândalo da História. Se depois de saquear a Petrobrás um governo adversário aconselhasse ao mais ingênuo dos petistas como se comportar, ele riria na cara do interlocutor. Só não rio mais porque ando preocupado. Essa mistura de preocupação e riso me faz sentir personagem de uma tragicomédia.

Em 2003, disse que o PT tinha morrido como símbolo de renovação. Me enganei. O PT morreu muitas vezes mais. Tenho de recorrer ao Livro Tibetano dos Mortos, que aconselha a seguir o caminho depois da morte, sem apego, em busca da reencarnação. Em termos políticos, seria render-se à evidência de que saqueou a Petrobrás, comprou, de novo, a base aliada e mergulhar numa profunda reflexão autocrítica. No momento, negam tudo, mas isso o Livro Tibetano também prevê: o apego à vida passada é muito comum. Certas almas não vão embora fácil.

A crise é um excelente psicodrama: o ceticismo político, a engrenagem que liga governo a empreiteiras, o desprezo pelas evidências, tudo isso vira material didático.

Dizem que Dilma vive uma tempestade perfeita com a conjunção de tantos fatores negativos. Navegar num tempo assim, só com o preciso conhecimento que o velho Zé do Peixe tinha da costa de Aracaju, pedra por pedra, corrente por corrente. No mar revolto, sob a tempestade, os raios e trovões não obedecem aos marqueteiros. Por que obedeceriam?


O ministro da Justiça vê o incômodo de um terceiro turno. Não haverá terceiro turno, e, sim, terceiro ato. E ato final de uma peça de teatro é, quase sempre, aquele em que os personagens se revelam. Por que esses olhos tão grandes? Por que esse nariz tão grande, as mãos tão grandes, vovozinha?

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

A Nau dos Insensatos - Versão tupiniquim


A Nau dos Insensatos (Das Narrenschiff - Ship of Fools) é um poema satírico de autoria de Sebastian Brant e publicado em 1494.

O livro foi um fenômeno editorial, reeditada dezenas de vezes, ainda durante a vida de seu autor, e traduzido para todos os idiomas ocidentais, um fato bem incomum na época.

O poema não tem enredo. É uma coleção de sermões, de forte cunho moralizante. Não tem ordem cronológica. Cada um dos sermões pode ser lido separadamente e em qualquer ordem.

Nesta  embarcação, tripulada por insensatos, Brant retrata o que havia de pior no final do século XV: avarentos, perdulários, egoístas, arrogantes, ignorantes.

No poema Brant afirma que “navegamos às cegas na nau que só tem um porto de chegada: a danação eterna.”

Sebastian Brant (1457 – 1521), nascido em Strasbourg,  era um erudito professor de Direito Romano e Direito Canônico da Universidade de Basileia, na Suíça.


Jamais saberia ele que seu texto teria uma aplicação tão precisa num país da América do Sul, 520 anos depois.

Dia da Consciência Negra?

Hoje é comemorado em várias cidades o "Dia da Consciência Negra".

Interessante. Consciência Negra, não é? Negra. Bacana.

Quem é mesmo racista, neste país?

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

A coisa está ficando feia . . .

Recebí de um amigo:

 Investigadores do Departamento de Justiça dos EUA, a partir de informações obtidas nos processos da Operação lava Jato, já identificaram o centro bilionário de lavagem de dinheiro de corruptos políticos do Brasil. Incentivos fiscais do estado de Nevada foram usados por centenas de empresas abertas em nome de brasileiros para investir a grana obtida em negociatas com o setor público. A maior parte das operações do doleiro Alberto Youssef se direcionava para aquele estado norte-americano famoso pelos impostos baixíssimos.

               Investigadores já descobriram que o principal sistema para lavagem de dinheiro era uma espécie de investimento em participações acionárias de hotéis. O esquema mafioso-contábil superfatura as tarifas, cobrando pelo teto de hospedagem, sem que tenha ocorrido ocupação de quartos. As notas fiscais são emitidas, recolhendo-se e os mínimos impostos cobrados em Nevada. Os resultados financeiros tornavam legalizado o dinheiro de brasileiros que doleiros "transportavam".

               No submundo do Congresso Nacional, em Brasília, já se comentava ontem que os peritos norte-americanos já identificaram centenas de políticos com negócios apenas em Nevada. Eles foram descobertos pelo complicado cruzamento de dados de parentescos. A maioria das empresas é registrada em nome de laranjas. Os mais idiotas usaram parentes. Os mais espertos usaram "amigos" com maior dificuldade de rastreamento, mas que foram identificados por uma coincidência fatal. Todos usaram o doleiro Youssef como "Banco Central".

               A novidade é que as falcatruas agora mapeadas já tinham sido usadas no velho escândalo do Mensalão - que agora é exemplo de impunidade. O maior prejudicado foi Joaquim Barbosa, pressionado a se aposentar, pelo rigor excessivo com que agiu no julgamento da Ação Penal 470. A maioria dos condenados já está tecnicamente solta, cumprindo regime de "prisão domiciliar", excetuando-se Marcos Valério Fernandes de Souza - que, uma hora, pode ficar pt da vida e partir para alguma delação premiada. Por enquanto, Valério mantém o silêncio obsequioso na cadeia, para alívio de muitos grandes investidores no ramo de hotelaria...

               O pavor agora é com o Petrolão. O manjado esquema pode vir à tona por pressão de investidores norte-americanos injuriados com os prejuízos que tiveram na Petrobras, por causa das negociatas identificadas na Operação Lava Jato. Agora, a coisa pode ficar séria para os corruptos brasileiros porque o Departamento de Justiça dos EUA resolveu levar o caso aos tribunais. Uma ação criminal corre em sigilo judicial para apurar se a Petrobras ou seus funcionários, intermediários ou prestadores de serviço violaram o Foreign Corrupt Practices Act, uma lei contra a corrupção que torna ilegal subornar funcionários estrangeiros para ganhar ou manter negócios. Outra ação civil é movida pela Securities and Exchange Comission (SEC, órgão do governo norte-americano que regula o mercado de capitais), já que a Petrobras tem recibos de ações negociados na Bolsa de Nova York.

               A coisa ficará mais preta que petróleo porque, como o Alerta Total antecipou, pelo menos três magistrados da Corte de Nova York já estariam dispostos a agir com total rigor contra diretores e ex-dirigentes da Petrobras, incluindo a ex-presidente do Conselho de Administração Dilma Rousseff, assim que chegarem aos tribunais os processos civis e criminais que apuram lesões contra investidores norte-americanos geradas por práticas de corrupção ou suborno.

               Não teria preço o vexame internacional de o Brasil ter sua "Presidenta" processada nos EUA, com alto risco de ser condenada a pagar multas milionárias. Nos States, o "Big Petroleum" (vulgo Petrolão) corre em sigilo judicial. Moralmente, o segundo mandato já termina sem sequer começar. E não adianta Dilma dar beijinho no ombro do Barack Obama - porque ele nada tem a ver com o rolo...

               Processar grandes empresas rende muita grana nos EUA, inclusive com premiações para juízes e promotores. As recompensas previstas na legislação norte-americana para quem faz "colaboração premiada" para desvendar crimes econômicos variam de 10% a 30% do valor do suborno ou de superfaturamento. Várias companhias ligadas à indústria do petróleo já foram condenadas pela lei anti-corrupção nos EUA.  As multas impostas pelas condenações foram pesadíssimas. A Security and Exchange Comission, xerife do mercado de capitais, não perdoa. A recordista foi a Panalpina (que subornou autoridades na Nigéria, Angola, Brasil, Rússia e Cazaquistão, sendo obrigada a pagar a megamulta de US$ 81,9 milhões.

               Nos rigorosos tribunais dos EUA, sobretudo os de Nova York, com a mão pesada da SEC, já dançaram várias empresas de grande porte, pagando multas milionárias. Pride International (US$ 56,1 milhões), Royal Dutch Shell (US$ 48,1 milhões), Transocean (US$ 20,6 milhões, Noble Corporation (US$ 8,1 milhões), Tidewater (US$ 7,5 milhões), GlobalSantaFe (US$ 5,8 milhões). As pesadíssimas multas também doem no bolso dos dirigentes empresariais envolvidos nos escândalos. Eis o grande risco que correm a Petrobras, seus diretores e conselheiros (de administração e fiscal), graças às várias denúncias, com provas, do Petrolão. Como o Tio Sam odeia pizza, a parada fica indigesta para os brasileiros.

               Não era novidade que o governo dos EUA, através da NSA, não só espionou as falcatruas na Petrobras como também já investigava, formalmente, denúncias de corrupção na petrolífera brasileira. A novidade ruim para Dilma Rousseff foi que o Petrolão ganhou dimensão mundial ontem, graças a uma reportagem do Financial Times. O jornal britânico informou que uma ação criminal e outra civil apuram se "a Petrobras ou seus funcionários, intermediários ou prestadores de serviço violaram o Foreign Corrupt Practices Act, uma lei contra a corrupção que torna ilegal subornar funcionários estrangeiros para ganhar ou manter negócios".

               A matéria do Financial Times deixou Dilma pt da vida porque destacou que "muitos dos supostos problemas ocorreram quando a presidente Dilma Rousseff foi chefe da empresa antes de tomar posse (como presidente da República) em 2011". Concretamente, Dilma já sabe que, independentemente de ser chefe de Estado, corre o risco de ser alvo de investigação e processo nos EUA.

               O FT apavorou a petralhada: "O Departamento de Justiça dos Estados Unidos abriu uma investigação criminal sobre a companhia que tem recibos de ações negociados em Nova York. Enquanto a Securities and Exchange Comission (SEC, órgão do governo norte-americano que regula o mercado de capitais) realiza uma investigação civil".


               Por Jorge Serrão

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Estarrecimento

Ué, a Dilminha não ficou "estarrecida" com o vazamento da Operação Lava Jato, na última sexta-feira?

Os policiais federais ficaram surpresos ao chegar na casa dos empresários que tinham mandado de prisão e encontrá-los com mala pronta e na companhia de seus advogados.

Será que o ministro da "justiça" vai mandar investigar?

Ou só funciona quando o vazamento é sobre os políticos da base aliada?


Pílula do dia seguinte

Excelente artigo do Fernando Gabeira, com uma análise concisa do que está acontecendo no Brasil, depois do 26 de Outubro.

Pílula do dia seguinte

Fernando Gabeira

Com robusta experiência em derrotas eleitorais, arrisco-me a prescrever esta pílula do dia seguinte.

Um dos primeiros aprendizados na derrota é superar qualquer impulso de culpar os eleitores ou regiões inteiras pelo resultado das urnas. É preciso examinar as políticas que nos levaram a esse resultado, os erros que cometemos ao longo do caminho.

Outra ilusão é supor que, eleito, o adversário vá realizar a política de quem perdeu. Muitos esperam mudança na política econômica de Dilma. Sou mais cético, embora reconheça a força da realidade, a enorme pressão que os próprios fatos vão exercer sobre seu governo.

A política econômica de Dilma não nasceu apenas de sua cabeça. Ela tem uma base teórica que sempre foi bastante influente entre os economistas e acadêmicos. O centro do debate é o papel do Estado na economia.
Até a crise de 2008 era uma visão na defensiva na própria conjuntura mundial. Como casais condenados a viver juntos, era preciso rediscutir a relação Estado e mercado, o peso que teriam na nova pós-crise.

Isso aconteceu até nos Estados Unidos, onde Obama lançou um plano de recuperação na economia, que agora chega a seu fim, atingindo o objetivo. Caminhos teóricos distintos levaram a escolhas distintas. Na compreensão de Obama, o Estado precisava impulsionar a economia porque é dele que depende sua sobrevivência.

A intervenção do Estado na economia brasileira, em linhas gerais, enfraqueceu o papel do mercado, pelo fortalecimento da intervenção do governo. No campo da energia, as intervenções de Dilma para baixar o preço da eletricidade, voluntariosamente, e conter o preço da gasolina são evidências de que superestimam o papel do Estado. Aliadas, é claro, a uma grande vontade de ganhar as eleições. Os estímulos à indústria automobilística foram uma faca de dois gumes. Eles agravaram o problema da mobilidade urbana, que era um dos motores das manifestações de 2013. Essa política é uma contradição ambulante. Além disso, valeu um processo de protecionismo na Organização Mundial do Comércio.

No meu ponto de vista, o governo esteve sempre mais preocupado com a área da economia que domina: estatais e, indiretamente, a constelação de empresas que giram em torno delas. Houve estímulos via BNDES criando uma órbita em torno do governo. Uma órbita favorecida: toma-se dinheiro público coberto pelo sigilo bancário.

A conclusão oficial foi expressa por Guido Mantega: nossa política econômica foi aprovada nas eleições. A alguns quilômetros dali, Dilma afirmou que a mudança foi a palavra mais ouvida na campanha. Não vi contradição entre os dois, porque Dilma jamais associou a palavra mudança à economia, sempre afirmou que estava no caminho certo, que seu modelo era exemplo universal de como atravessar uma crise sem perda de salário ou emprego.
Durante esse período de exaltação do próprio desempenho, o governo jogou para baixo do tapete dados essenciais. Dois deles já vieram à tona: o rombo de R$ 20 bilhões nas contas públicas e o da redução da pobreza. Outros esperam no pipeline: índice de desmatamento na Amazônia, redução da pobreza, performance no ensino.

Dilma afirma querer esclarecido, em todos os detalhes e nomes, o escândalo de corrupção na Petrobrás. Tenho inúmeras razões para duvidar. O governo tentou bloquear a CPI, os vazamentos indicaram que a própria base do governo está envolvida; Lula e Dilma foram mencionados pelo doleiro Alberto Youssef. A realidade é que o governo vai considerar estratégico desqualificar as investigações. E não está sozinho nisso. As grandes empresas envolvidas contrataram poderosos advogados que fracassaram no mensalão, mas ganharam experiência para o novo confronto: o petrolão.

O Supremo terá 10 dos 11 ministros indicados pelo PT. Claro que alguns deles sabem que o PT passa e o Supremo fica. Mas sua gratidão será cobrada, como foi intensamente cobrada de Joaquim Barbosa. Esse processo do escândalo na Petrobrás será uma intensa luta entre quem quer saber e punir e quem quer esconder e inocentar. Não creio no êxito da tentativa de esconder. O escândalo ultrapassou as fronteiras: auditorias internacionais serão realizadas e as leis americanas são difíceis de driblar.

O assalto à Petrobrás e a política econômica se entrelaçam e podem nos levar a um debate um pouco mais concreto sobre este capitalismo de Estado que o PT impulsiona. A corrupção instalou-se no cofre da maior empresa estatal e se estendeu para toda a constelação que gira em torno dela.

Dilma afirmou que vai entregar o Brasil pronto para um novo ciclo de crescimento. Obama fala como se tivesse concluído a tarefa. Alguém perdeu tempo nestes cinco anos.

Nunca tive a experiência de uma vitória em eleição majoritária. Mas havia uma questão temível esperando o vencedor na manhã seguinte: como fazer tudo o que prometi?

Os anos serão duros para Dilma. Seca no Sudeste, seca de ideias sobre política de recursos hídricos, economia estagnada e uma tentativa de provar que vivemos na realidade dos programas de televisão da campanha. Será preciso um grande plantel de macunaímas para o governo escapar ileso dos fatos, das leis da economia e de um bilionário processo de corrupção. E não podem dizer como o nosso herói sem nenhum caráter: ai, que preguiça!

O desdobramento de uma política econômica fracassada e o desenrolar do maior processo de corrupção da história do País devem produzir um debate muito mais próximo da realidade do que uma fantasia novelesca da agenda eleitoral. Minha esperança é que as pessoas olhem bem para a falência da economia e a gravidade da corrupção na Petrobrás. E esqueçam um pouco quem foi parado na Lei Seca, quem estava preparando tirar a comida da mesa dos pobres para depositá-la no Banco Central independente. Assistimos a uma ficção da pior qualidade. Precisamos voltar à realidade cotidiana. O assalto à Petrobrás foi uma audácia. Audácia maior é o assalto à nossa lucidez.

*Fernando Gabeira é jornalista

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

A novidade da Petrobrás: Diretoria anti-corruptos!

Seria cômico se não fosse trágico.

A simpática presidente da Petrobras, anunciou que vai criar uma diretoria para evitar a corrupção.
Deu na Folha de São Paulo:

A presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, anunciou que a empresa está estudando criar uma nova diretoria, para assegurar o "cumprimento de leis e regulamentos internos e externos".
O estudo para a criação da nova diretoria foi aprovado na sexta-feira (14), em reunião do conselho de administração da companhia.
O anúncio foi feito na manhã desta segunda-feira (17), durante a teleconferência de apresentação de resultados operacionais da companhia no terceiro trimestre. A empresa não vai divulgar o balanço contábil do período, que ainda não foi assinado pelos auditores externos independentes, como exige a lei.
Desde março deste ano, a Petrobras é alvo da Operação Lavo Jato, da Polícia Federal, que investiga o esquema de lavagem e desvios de dinheiro em contratos assinados com empreiteiras, que somam R$ 59 bilhões, considerando o período de 2003 a 2014. Até agora, 23 executivos, entre eles presidentes de empreiteiras e o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, foram presos.
"Nós mitigaremos riscos assegurando, pela companhia, o cumprimento das leis e regulamentos externos e internos. O respeito técnico é uma conquista de muitos anos. Gostaria de ressaltar a importância que é ter uma diretoria de governança, porque queremos mais que o reconhecimento técnico que conquistamos. Nós queremos também o respeito pela governança da nossa companhia, a Petrobras", disse Graça, em teleconferência com analistas.
A presidente não anunciou quem vai ser o titular da nova diretoria. "Ainda estamos estudando, e nem de longe temos um nome ainda".

Bacana, né? Quem vai indicar o diretor? O Dirceu, O Zé, o Delúbio, o Renan ou Barbalho?

Vai ser o único diretor vacinado contra corrupção, na empresa?

Tenha respeito ao povo brasileiro, Gracinha! 

Cumplicidade vergonhosa


Estranho país o Brasil.
Na sábado houve uma chamado para que a população decente saísse à rua e demonstrasse sua indignação com o maior escândalo de corrupção da história do país.

Aqui em Balneário Camboriú comparecemos umas 350 pessoas.

No domingo, houve um chamado para participar da Parada da Diversidade, eufemismo para o que conhecíamos como Parada Gay. Havia mais de mil pessoas.

Será que ter um país decente é menos importante?

Será que a Dilma conhece a Constituição Federal?

Leio nas notícias:

Em sua primeira manifestação pública sobre a nova etapa da Operação Lava Jato – que resultou, até agora, na prisão de 23 pessoas, entre as quais presidentes de empreiteiras e o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque –, a presidente Dilma Rousseff afirmou que as investigações do escândalo de corrupção podem "mudar o Brasil para sempre". A chefe do Executivo comentou a sétima fase da operação policial em coletiva de imprensa concedida, em Brisbane, na Austrália, pouco antes do encerramento do encontro de cúpula do G20.

Mas não é uma preciosidade? 

Esta senhora, a menos de um mês atrás, dizia-se "estarrecida" pelo vazamento de informações sobre a Operação Lava Jato. Seu ministro da "Justiça" mandou investigar os delegados envolvidos na operação, para apurar quem vazou conteúdo das investigações.

Ela mesmo ameaçou processar a revista VEJA, pelas denúncias publicadas.

O presidente do PT, ameaçou a mesma coisa e, aparentemente, entrou com uma ação de calúnia contra o ex-diretor da Petrobrás que deu início à delação premiada.

Em nenhum momento a Dilma declarou-se "estarrecida" com a dimensão do escândalo, nem nenhum membro do seu governo ou do seu partido mostrou-se "estarrecido" com as denúncias.

Agora, esta madame fala como se a apuração do que já é o maior escândalo de corrupção da história brasileira, fosse uma ação conduzida pelo seu governo.

Alguém precisa informar à esta senhora, que comprovadamente não entende nada de direito constitucional, que as atividades da Polícia Federal são definidas pela Constituição Federal e não dependem de ações do Poder Executivo.


Constituição Federal 
Art. 144.
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aérea e de fronteiras;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
(os destaques são meus)

Claro que o Brasil vai mudar depois do escândalo do Petrolão. Se não mudar, estará destinado a se transformar numa farsa.

Leitura adicional sugerida aqui

domingo, 16 de novembro de 2014

Intervenção militar?

Quem viveu o caos do último ano do governo João Goulart e assistiu/participou na Contra-Revolução de 31 de Março de 1964, fica estarrecido com os pedidos de "Intervenção Militar" que pipocam nas redes sociais e nas manifestações contra o desgoverno do PT e a maior rede de corrupção da história da República.

Explico por que fico estarrecido: parece que estas pessoas não aprenderam nada!

Diz-se que quem não aprende com a história está condenado a cometer os mesmos erros. É fato. Os brasileiros, conhecido por sua curta memória, também não gostam dos livros que registram sua história.

Os fatos que levaram aos acontecimentos culminados no dia 31/3/1964 ocorreram num cenário e numa época que não podem ser repetidos, como se fosse uma versão moderna, num "make-up" digital, de um antigo filme ou novela.

O mundo é outro, o Brasil é outro. O que se justificava em 1964, não se justifica hoje.

Historicamente os políticos colocaram o país em armadilhas ou encruzilhadas. Foi assim na criação da República, em 1889. Foi assim no final da Segunda Guerra Mundial, com a queda da ditadura de Getúlio Vargas e seu Estado Novo.

Foi assim com a eleição e posse de Juscelino Kubischek, só possível pela mão forte do General Henrique Lott, Ministro do Exército (chamado de Ministério da Guerra, na época), que garantiu a continuidade de democracia.

Foi assim no estabelecimento efêmero do parlamentarismo em 1961, como forma de evitar ( e só conseguiu o adiamento) as manobras de Jango e seu cúmplice Leonel Brizola, na tentativa de implantar no Brasil uma ditadura comunista nos moldes de Cuba.

Finalmente, foi assim em Março de 1964 no movimento, clamado pela classe média, pela Igreja, pelos ações sociais, que culminaram no estabelecimento de um governo militar que durou 21 anos.

Em todas estas ações em que os militares se envolveram na questão política (além de muitas outras não mencionadas como o Tenentismo de 1922, a intentona comunista de 1935, etc.), para resolver o imbroglio criado pelos políticos e pela sociedade brasileira, os militares foram convocados pelos civis e depois de afastado o perigo, violentamente criticados por quem os convocou: a sociedade brasileira.

Falar da segurança cidadã que se tinha entre 1964 e 1985 é como clamar no deserto. Quem viveu este período parece ter esquecido de como era e quem não viveu, não se preocupa em pesquisar a história e os fatos, preferindo ser emprenhado pelos ouvidos da propaganda oficialista.

A realidade é que depois de 29 anos, as Forças Armadas já não são o fiel da balança, na frágil democracia brasileira. Não adianta falar de "intervenção", pois ela não ocorrerá.

No século 21, a sociedade civil brasileira terá que aprender a tomar as atitudes necessárias para garantir sua liberdade e a democracia.

Esperar que isto venha dos quartéis é burrice política e atestado de incompetência cidadã.


Utopia



Na VEJA desta semana.

sábado, 15 de novembro de 2014

Pressão Máxima


Ao longo da semana passada, a tensão na diretoria da Petrobras estava nas máximas.
Diretor financeiro da empresa, Almir Barbassa era um dos que ameaçavam renunciar. Dizia que fez uma carreira na estatal, que não participou de esquema nenhum, e que está velho demais para este tipo de emoções.
Assim como Barbassa, muitos diretores só não renunciaram até agora porque foram convencidos pela presidente da empresa, Maria das Graças Foster, que os exortou a “segurar as pontas” usando o argumento da responsabilidade da diretoria para com os acionistas e a oportunidade de se defenderem e mostrarem que não estavam envolvidos.Graça-Foster
Não seria surpresa, no entanto, se a operação de hoje da Polícia Federal der o empurrão final para renúncias na diretoria da empresa, agravando ainda mais uma crise de proporções épicas: a empresa-orgulho do Brasil virou a empresa-vergonha do Brasil, sem balanço auditado, sem acesso ao mercado de dívida, com uma necessidade gigantesca de investir e um endividamento já preocupante.
Barbassa tem um mega pepino nas mãos: ele e o ex-presidente da empresa, José Sergio Gabrielli, assinaram balanços atestando junto à SEC a veracidade das informações prestadas aos investidores. Para operações como oferta de ações e emissões de dívida, um diretor financeiro assina cartas para os auditores (“representation letters”) atestando que as informações da empresa são verdadeiras, “to the best of my knowledge” (ou seja, ele atesta a veracidade “baseado no que ele sabe”).
Se a Petrobras agora tiver que republicar balanços antigos – reconhecendo os roubos do petrolão – as chances de Barbassa e Gabrielli serem responsabilizados são grandes.
Do ponto de vista pessoal, para estes diretores uma grande angústia é o que acontecerá com o seguro D&O (“Directors & Officers”), que as grandes empresas pagam para seus diretores e que cobrem seus custos com advogados se estes diretores forem processados por atos praticados no exercício de suas funções dentro da companhia. Se ficar comprovado que os diretores sabiam do esquema (mesmo não tendo participado dele), as seguradoras arcarão com os custos?
Pode-se imaginar o que vai na cabeça dos diretores da Petrobras implicados ainda que indiretamente no escândalo que não para de crescer: a perspectiva de uma vida respondendo a processos, indo a audiências, ou coisa pior. Receber cartas da SEC, do Departamento de Justiça americano, da Polícia Federal brasileira, do Ministério Público Federal. Gastar muito dinheiro se defendendo e, o pior, aquilo que dinheiro nenhum consegue comprar: a tranquilidade e a paz de espírito sequestrada da vida familiar. Os cônjuges, filhos e netos convivendo com as memórias da vergonha.
Dos muitos ensinamentos que esta implosão da Petrobras está produzindo, talvez o menos falado até agora seja um avanço ético valioso para o País: a partir de agora, no Brasil, não basta não ser corrupto. Também não dá pra trabalhar onde você sabe – ou simplesmente suspeita – que existe corrupção.
Geraldo Samor

Guardiões da Decência




Dia do Juízo Final - Versão Polícia Federal

LAVA-JATO – O “Dia do Juízo Final” e o Apocalipse do petismo

Diga-se pela enésima vez: o PT não inventou a corrupção. É claro que não! O que o partido fez foi transformá-la num sistema e alçá-la à categoria de uma ética de resistência. Nesse particular, sem dúvida, inovou. Se, antes, a roubalheira generalizada era atributo de larápios, de ladrões, de safados propriamente, ela se tornou, com a chegada dos companheiros ao poder, uma espécie de imperativo do “sistema”. Recorrer às práticas mais asquerosas, contra as quais o partido definiu o seu emblema na década de 80 — “Ética na política” —, passou a ser chamado de “pragmatismo”.

Observem que o partido não se tornou “pragmático” apenas nessas zonas em que a ação pública se transforma em questão de polícia. Também a sua política de alianças passou a ter um único critério de exclusão: “Está do nosso lado ou não?”. Se estiver, pouco importa a qualidade do aliado. Inimigos juramentados de antes passaram à condição de fieis aliados. O símbolo dessa postura, por óbvio, é José Sarney. No ano 2000, Lula demonizava Roseana nos palanques; em 2003, os petistas celebraram com a família uma aliança de ferro.

Os demônios que vão saindo das profundezas da Petrobras são estarrecedores. Não se trata, como todos podemos perceber, de desvios aqui e ali, como se fossem exceções a regras ancoradas no rigor técnico. Não! A corrupção era, tudo indica, sistêmica; não se tratava de um corpo estranho; era ela o organismo. E, convenham, parece que não havia valhacouto mais acolhedor e seguro do que a estatal. A Petrobras, com a devida vênia, nunca foi exatamente um exemplo de transparência, já antes de Roberto Campos ter-lhe pespegado a pecha de “Petrossauro”.

Em nome do nacionalismo mais tosco — antes, meio direitoso, com cheiro de complexo burocrático-militar; depois, com o viés esquerdoso, tão bocó como o outro, só que ainda mais falsificado —, há muitos anos a empresa se impõe ao país, não o contrário. Não foram poucas as vezes em que mais a Petrobrás governou o Brasil do que o Brasil, a Petrobrás. Com a chegada do PT ao poder, o que já era nefasto ganhou ares de desastre.

A empresa passou a ser o “bode exultório” — que é o oposto do “bode expiatório” — da esquerdofrenia petista. E porque o partido é esquerdofrênico? Porque o estatismo advogado pelos “companheiros” só pode ser exercido, como é óbvio, com o concurso do capital privado, com o auxílio de alguns potentados da economia, com o amparo de quem reúne a expertise para tocar a infraestrutura. E o resultado é o que se tem aí.

Não vou livrar a cara das empreiteiras, não. Quem não quer não corrompe nem se corrompe. Mas não dá para esquecer o depoimento de Alberto Youssef ao juiz Sérgio Moro, em que sobressaem duas informações importantes:
1) o doleiro afirmou que era pegar ou largar; ou as empreiteiras aceitavam pagar o preço — ou melhor, incluir a propina no preço —, ou estavam fora do jogo; e boa parte preferiu jogar;
2) indagado por Moro se as empreiteiras costumavam cumprir a sua parte no acordo, Youssef disse que sim. E explicou os motivos: ela tinham muitos interesses em outras áreas do governo, não apenas na Petrobras. Afinal, também constroem hidrelétricas, estradas, infraestrutura de telecomunicações etc.

Assim, duas conclusões se fazem inevitáveis:

1) as empreiteiras, tudo indica, atuaram como corruptoras, sim, mas é razoável supor que falavam a linguagem que o outro lado queria ouvir;
2) não há por que o padrão de governança das demais estatais e órgãos públicos federais ser diferente.

Como já afirmei neste blog muitas vezes, estamos diante de um método, não de um surto ou de um lapso da razão.

Já está mais do que evidente, a esta altura, que Lula e Dilma foram suficientemente advertidos para parte ao menos dos descalabros. Os que se lançaram a tal empreitada, talvez ingenuamente, imaginavam que a dupla não sabia de nada. A questão, meus caros, desde  sempre, é outra: havia como não saber? Tendo a achar que não. O TCU alerta, por exemplo, para os desvios da refinaria de Abreu e Lima desde 2008.

Recorram aos arquivos. A partir de 2010, o então presidente Lula começou a atacar os órgãos de fiscalização e controle, muito especialmente o TCU. No dia 12 de março daquele ano, foi ao Paraná inaugurar a primeira etapa das obras de modernização e ampliação Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), em Araucária, na região metropolitana de Curitiba. O Tribunal de Contas havia recomendado a suspensão de verbas para a Repar justamente por suspeita de fraude e superfaturamento. Lula não deu pelota e ainda atacou o TCU. Leiam:

Sou favorável a toda e qualquer fiscalização que façam, até 24 horas, via satélite. Acontece que as coisas são complicadas. Muitas vezes, as pessoas levantam suspeitas de uma obra, paralisam a obra e, só depois da obra paralisada, chegam à conclusão de que está correta. Quem paga o prejuízo da obra paralisada? Não aparece. O povo brasileiro paga porque não tem obra”.

Pois é… Vejam quanto “o povo brasileiro” está pagando pelo método Lula de fazer política.

O terremoto que está em curso abalou as empreiteiras, aquelas que ou pagavam a propina ou ficavam fora do negócio.. Pesos pesados do setor estão na cadeia, alguns em prisão preventiva, e outros, em prisão provisória. Mas estamos bem longe do topo na escala. Estima-se que o esquema possa enredar nada menos de 70 políticos, muitos deles com mandato. A delação premiada pode devastar parte considerável da classe política brasileira. E, aí sim, talvez saibamos o que é a terra a tremer.

E a gente se espanta ao constatar que o segundo mandato de Dilma ainda não começou. Talvez só em janeiro muita gente se dê conta de que pode haver mais quatro anos de mais do mesmo, só que num cenário à beira do abismo.

Policiais Federais chamaram esta sexta de “Dia do Juízo Final”, que é apenas uma passagem do Apocalipse!


Por Reinaldo Azevedo

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Prisões da Lava Jato tornam o clima ainda pior para Dilma



Volte para 2011. Dilma Rousseff, mãe do PAC, ungida por Lula e eleita, assumiu o poder como a primeira mulher a subir a rampa do Planalto na qualidade de presidente. Seu antecessor lhe passou a faixa aprovado por mais de 80% dos brasileiros. A eleição não foi fácil, sobretudo após o escândalo Erenice Guerra e o debate sobre aspectos morais e bioéticos. Mas Dilma venceu. A novidade naquele ano foi o fim da verticalização e a parceria formal com o PMDB na chapa como vice. E, para celebrar a aliança, um apoio de 100% do partido na primeira votação expressiva, associada ao salário mínimo, sob um novo Congresso empossado algumas semanas depois de a presidente desembarcar no gabinete.
 Caminhe agora cerca de dois anos após esse instante. O PMDB já não era mais tão fiel, mas ainda assim a presidente tinha forte maioria no Congresso Nacional e cerca de dois terços dos brasileiros estavam satisfeitos com sua condução - a despeito de uma faxina ética ter deixado vasos quebrados nas relações entre aliados. Estávamos em março de 2013, mas em junho o povo foi às ruas. A popularidade despencou, mas os manifestos não tinham Dilma e o governo federal como alvos específicos.
A insatisfação era generalizada, e respingou sobre diversos políticos e partidos, incluindo uma oposição que não conseguiu se firmar como alternativa clara. Assim, em 2014, a despeito de cerca de 70% do povo clamar por mudanças em pesquisas realizadas pelo Ibope ao longo das eleições, o governo conseguiu se reeleger com bordões do tipo “muda mais” e “novo governo, novas ideias”. A combinação entre a competência do marketing e a incompetência da oposição em firmar-se como alternativa na última década contribuíram para esse final, cujo resultado foi apertado. A ansiedade gerada ao longo de toda a eleição trouxe fissuras políticas entre setores da sociedade, e os dias que antecederam o segundo turno lembraram o saudoso Dominguinhos: “Olha quem tá fora quer entrar, mas quem tá dentro não sai”.
O ambiente esperado para 2015, assim, é bem diferente daquele de 2011.
A presidente Dilma começará seu segundo governo com uma situação econômica ruim e um clima político instável. A reversão desse cenário não parece fácil, e é ainda agravada por fatos como a Operação Lava Jato, com nova fase deflagrada hoje pela Polícia Federal, que prendeu representantes de empresas imensas e um ex-diretor da Petrobras.
Aspectos econômicos à parte – e eles merecem toda a atenção – o clima político não é saudável. PT e PMDB, por exemplo, lutam por espaço dentro do governo - dentro de si e entre si. Os partidos aliados mostram que não se contentarão com menos do que já têm. E a oposição promete ser... oposição.
O Congresso Nacional se pulverizou, nas urnas, em bancadas menores no campo da situação e dos partidos governistas a partir de 2015. Isso oferta ao Executivo a percepção que pode governar sem depender de determinados parceiros, mas também oferece aos partidos o sentimento de que podem se fundir ou formarem bancadas mais consistentes para chantagens mais aparentes. Os movimentos apontam para esta direção, e as negociações que tanto irritam a presidente terão que ser feitas cirurgicamente. Por quem? Dilma e Mercadante não serão lembrados na história por tais habilidade. E Lula? A questão é saber de qual deles estamos falando: de um dos mais hábeis seres políticos do país ou do sujeito ao qual a propaganda de Dilma, estrelada por Chico Buarque nas eleições, atribuiu um peso menor no presente?
Para completar, um elemento que aproxima fantasmas do passado com assombros do presente: a corrupção. Em 2006 e 2010 foi o Mensalão, e a crença popular de que grandes líderes nada sabiam sobre a mesada. Em 2014, o que se chamou de Petrolão, que parte da imprensa diz ser de conhecimento de quem efetivamente manda e cujos novos capítulos foram escritos hoje. Assim: Congresso instável, partidos “parceiros” cobrando caro, oposição mais ácida, cenário econômico frágil e escândalos se adensando. O clima mudou.
Humberto Dantas é cientista político e professor do Insper. Exame.com em 14/11/2014.
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