Após a
batalha de Ásculo, o rei Pirro, ao felicitar seus generais depois de verificar
as enormes baixas sofridas por seu exército, teria dito que com mais uma
vitória daquelas estaria acabado. Desde então, a expressão "vitória de
Pirro" é usada para expressar uma conquista cujo esforço tenha sido penoso
demais. Uma vitória com ares de derrota.
Eis a
sensação dessa vitória apertada de Dilma na reeleição. O Brasil está claramente
dividido. A máquina estatal foi colocada a serviço do projeto de poder do
partido. Houve denúncias de crime eleitoral, claro terrorismo com os
dependentes dos programas assistencialistas, ameaça aos funcionários públicos.
As baixarias usadas pela campanha da presidente, antes contra Marina e depois
contra Aécio Neves, entrarão para a história como as mais sórdidas da nossa
democracia.
Bem que
Dilma tinha avisado que faria “o diabo” para vencer. Fez mesmo. E metade do
país — a metade mais esclarecida e honesta — ficou estarrecida com o que viu.
Nunca antes na história deste país se apelou tanto. O Brasil foi segregado. O
“nós contra eles” virou o mantra daqueles que tentam monopolizar o discurso em
defesa dos pobres, mas atendem, na verdade, aos interesses de uma elite
corrupta e carcomida.
Os velhos
caciques nordestinos celebraram, assim como Maluf e os mensaleiros presos na
Papuda. O tirano Fidel Castro também deu pulos de alegria, assim como Nicolás
Maduro. Kirchner, que vem destruindo a Argentina de forma acelerada, talvez com
inveja da capacidade destrutiva do camarada venezuelano, foi outra que vibrou
com a reeleição.
As urnas
deram um resultado legal, apesar de denúncias de fraude que deveriam ser
averiguadas. Mas qual a legitimidade de uma vitória tão apertada conquistada
somente com base nas táticas mais pérfidas e imorais que existem? É uma vitória
que colocou boa parte da classe trabalhadora de luto. Aqueles que pagam as
contas do populismo petista. Aqueles que não suportam mais tantos impostos,
tanta demagogia, tanta roubalheira.
A
presidente Dilma falou em união em seu discurso de vitória, mas soa muito
falso, não convence. Como ignorar todo o racha fomentado durante sua campanha
indecente? Fingir que nada ocorreu é impossível. O país chega completamente
partido ao meio por obra do próprio PT, que sempre precisou de inimigos e
jamais colocou os interesses nacionais acima do seu projeto de poder.
Além disso,
Dilma terá a verdadeira “herança maldita” agora pela frente. Não dará mais para
culpar o governo de FHC ou a “crise internacional”, que faz os nossos pares
emergentes crescerem o dobro da gente com a metade da taxa de inflação. O que
vem por aí — e não será nada bonito de se ver — será colocado totalmente na
conta da “presidenta”. Não haverá mais bodes expiatórios.
A economia,
hoje estagnada, vai piorar ainda mais. A inflação, hoje muito elevada, vai
subir ainda mais. O desemprego vai subir. A Petrobras, hoje pilhada, será
finalmente destruída. E a roubalheira vai seguir seu curso, com a metade dos
eleitores cúmplice, conivente. As conquistas sociais estarão em risco, e talvez
a esquerda finalmente aprenda que não há dicotomia entre pobres e ricos, entre
social e economia.
Nossas
frágeis instituições serão testadas ao limite. Dilma herda um escândalo jamais
visto, com evidências de desvios bilionários na maior estatal do país, e com o
doleiro do próprio partido afirmando que ela e Lula sabiam de tudo. Se a
denúncia for confirmada, um processo de impeachment não está descartado.
Collor, hoje aliado do PT, caiu por muito menos.
Metade do
Brasil finalmente acordou. Os anos de lulopetismo serviram ao menos para isso:
despertar a indignação daqueles que são obrigados a pagar a fatura da
irresponsabilidade, da incompetência e da corrupção do PT. Estamos cansados.
Estamos de luto. E estamos, acima de tudo, vigilantes, atentos, de olho nos
próximos passos do governo, que flerta abertamente com regimes opressores que
censuram a imprensa independente.
A reação
odienta e raivosa de muitos petistas, mesmo vencedores, demonstra como estão
inseguros, tensos. Afinal, o Brasil ainda não é uma Venezuela. Temem ainda a
punição legal por tantos anos de falcatruas, por terem permitido que uma
quadrilha se instalasse dentro de nossas empresas e instituições. A oposição
acordou. Está mais organizada e tem líder. E não vai assistir passivamente à
pilhagem do nosso Estado.
A luta
apenas começou. E a vitória deles foi com gosto de derrota, pois sabem que vem
chumbo grosso por aí. Quem pariu Mateus que o embale...
Rodrigo Constantino, O Globo, 28/10/2014
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