Na primeira reunião com seu novo Ministério, a presidente Dilma Rousseff não tratou de questões administrativas, pois ela já não governa mais. O único tema relevante do encontro foi a perspectiva, cada vez mais real, de que sofra um processo de impeachment. E Dilma implorou a seus ministros que trabalhem para manter o mandato presidencial, pois para isso foram nomeados - e não para administrar a coisa pública e cuidar do bem-estar da Nação.
Dilma é
hoje uma alma penada, como aquelas que, segundo a tradição medieval cristã,
esperam abreviar seu sofrimento por meio da caridade dos que despejam alguns
trocados na bacia de doações da igreja. A petista recorre agora a essa “bacia
das almas” porque perdeu todas as chances de se redimir de seus pecados
políticos e administrativos e depende exclusivamente da boa vontade de
terceiros como última cartada para salvar-se do inferno do ostracismo. E essa
boa vontade, como se sabe, não é nada desinteressada.
Dilma
montou um novo Ministério na expectativa de aplacar o apetite fisiológico da
chamada “base aliada” e, assim, garantir apoio no Congresso para impedir a
aprovação de mais gastos públicos e, principalmente, para barrar o impeachment.
A persistente falta de quórum para votar os vetos de Dilma a projetos que criam
despesas mostrou que os novos amigos da presidente não têm como entregar aquilo
que lhe prometeram, pois está cada vez mais claro que, uma vez dada a mão, os
“governistas” querem arrancar também o braço - e não se satisfarão com esse
membro.
Enquanto
isso, a “governabilidade” fica a depender de gente cada vez menos qualificada,
num processo de degradação da administração que desautoriza qualquer
manifestação de otimismo sobre o País num futuro previsível. Para Dilma, porém,
isso não parece ser importante. A única coisa que interessa é segurar-se na
cadeira presidencial, custe o que custar.
Para
isso, a presidente e seus cada vez mais raros defensores passaram os últimos
tempos a acusar a oposição de atropelar as instituições democráticas com o
objetivo de dar um golpe. No entanto, com a derrota sofrida no Tribunal de
Contas da União, que rejeitou as contas de seu governo, e no Tribunal Superior
Eleitoral, que autorizou o prosseguimento de uma ação que pode lhe cassar o
mandato, ficou claro que as instituições, repletas de ministros nomeados pelo
próprio governo petista, funcionam muito bem - e então Dilma se viu obrigada a
mudar seu discurso.
Agora, a
presidente, caprichando no “dilmês”, diz que pode estar em curso no País um
“golpe democrático”, a exemplo do que, segundo ela, aconteceu no Paraguai em
2012. Trata-se de uma referência ao impeachment do então presidente paraguaio,
Fernando Lugo, como resultado de um processo que durou pouco mais de 24 horas -
tudo feito segundo o que previa a lei local. Na visão de Dilma, a oposição
brasileira, assim como fez a paraguaia, quer dar um “golpe” usando as
ferramentas oferecidas pelas próprias instituições democráticas. Assim, seu
impedimento não seria legítimo, mas fruto de manobras espúrias, com simples
aparência de legalidade.
Com
isso, Dilma quer desmoralizar qualquer forma de processo contra si e contra seu
governo, mesmo que seja conduzido dentro do mais estrito respeito às normas
democráticas e constitucionais. É, para dizer o mínimo, uma atitude
autoritária.
Em vez
de denunciar o tal “golpe à paraguaia” no Brasil, Dilma deveria se empenhar em
salvar um pouco da dignidade que lhe resta, a começar pelo reconhecimento
sincero de seus erros. Mas não. Dilma até desistiu de negar as “pedaladas
fiscais”, pois já não é mais possível dizer que elas não existiram, mas
instruiu seus ministros a dizer que aquele artifício contábil foi necessário
porque era a única maneira de manter em dia os programas sociais em meio à
crise econômica. Com isso, a petista admite que pecou, mas quer convencer o
País de que foi por uma boa causa. Se é assim que Dilma pretende ser remida de
suas faltas, haja indulgência.
Opinião, O Estado de São Paulo, 11/10/2015
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