Uma coisa é
certa, absolutamente factual: 90% da população brasileira não confia na
presidente Dilma Rousseff, subtraindo-lhe assim, se não a legitimidade, com
certeza a credibilidade como governante. Está em questão o futuro do País,
paralisado pelo impasse político, pela crise econômica e pela degringolada
moral que o petrolão expôs.
Há salvação? Certamente ela existe, mas para
descobri-la é preciso um ato de grandeza que derrote a mediocridade reinante. É
indispensável que, acima de interesses pessoais ou de grupos, as forças vivas
da Nação se unam para recuperar o País, pois não é isso, infelizmente, o que a
chamada classe política está fazendo. No momento estão todos concentradíssimos
no vale-tudo para salvar a própria pele ou levar vantagem com a situação.
Senão,
vejamos. Os governistas apelam a toda sorte de chicana no desespero de
preservar suas posições. Os antigovernistas – a oposição formal e os
oportunistas habituais, estes sempre em maioria – agem exatamente da mesma
forma: recorrem a toda sorte de chicana para tomar o poder. Os primeiros
tiveram 12 anos para mostrar a que vieram e, incapazes de impedir o retrocesso
de suas próprias conquistas, não têm nada de novo a dizer. A oposição, além de
criticar o governo – o que nas atuais circunstâncias não chega a exigir talento
ou esforço –, tem a dizer o quê? Que está tudo errado já se sabe. Basta ouvir
as ruas. Propostas novas e convincentes não há.
O pior,
porém, é o oportunismo político personificado por Eduardo Cunha, uma figura
insólita até para os padrões de lassidão moral com que o lulopetismo contaminou
a política. Eduardo Cunha é moralista. Mas é, ao mesmo tempo, capaz de
beneficiar-se de transações financeiras escusas e de negar pública e oficialmente
as evidências que o comprometem. O parlamentar fluminense não tem o menor
escrúpulo em usar o poder de que é investido na presidência da Câmara dos
Deputados para retaliar e chantagear a Presidência da República, a quem
responsabiliza pelo vazamento de informações que o comprometem com a Operação
Lava Jato. Usará até o fim, para tentar se salvar, os recursos regimentais a
seu alcance para manter a espada do impeachment pendendo sobre a cabeça de
Dilma Rousseff.
A
degradação política e moral do País felizmente não chega – como o lulopetismo
quer fazer crer – ao absurdo de colocar Dilma e Cunha como o contraponto
emblemático da crise. Entre a soberba, o autoritarismo e a incompetência da
chefe do Executivo e a hipocrisia, o autoritarismo e a competente falta de
escrúpulos de Eduardo Cunha, não há opção. Os brasileiros querem ver os dois
pelas costas e o Brasil caminhando para um futuro de paz, justiça e
prosperidade.
Dessa
perspectiva, o impeachment de Dilma não pode ser um fim em si mesmo, mas apenas
um primeiro passo para o consenso mínimo que reúna lideranças capazes de traçar
um roteiro seguro para novos tempos. E esse meio não pode ser obtido ao arrepio
da lei.
Enquadra-se,
portanto, numa perspectiva saudável para o novo arranjo político que o País
pede, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspende o rito de
tramitação do impeachment no Congresso concebido por Eduardo Cunha com a
cumplicidade de oposicionistas. A liminar deferida pelo ministro Teori Zavascki
elimina a possibilidade de, rejeitado pelo presidente da Câmara, um pedido de
discussão do impeachment ser encaminhado ao plenário para decisão por maioria
simples, se for dirigido à Mesa recurso com esse objetivo. Esse truque
regimental permitiria, por um lado, aliviar a responsabilidade do presidente da
Casa e, por outro, facilitar a abertura da discussão do impeachment. O rito de
processos de impeachment está bem definido desde 1950, quando foi aprovada a
Lei de Responsabilidade. De lá para cá, foi aperfeiçoada, inclusive pelo uso, e
não há por que não aplicá-la.
Certamente
a decisão de Zavascki decepcionou as lideranças oposicionistas e os cidadãos em
geral que torcem pela luz no fim do túnel representada pelo afastamento de
Dilma Rousseff. Mas a consolidação da democracia não se faz por atalhos. Ela
só é possível sob o império da lei.
Opinião - O Estado de São Paulo, 14/10/2015
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