Quem
semeia raios econômicos, colhe tempestades políticas e trovoadas sociais
Nem tudo
piorou de 2010 a 2014. Caíram de 131 para 98 por ano os brasileiros fulminados
por raios em diversas regiões do país, de todas faixas etárias e sociais. As
vítimas do que os antigos acreditavam ser a ira dos deuses são em número bem
maior do que as temidas mortes em acidentes aéreos e não há nada que as
explique, além de estar no lugar errado, na hora errada. Ou aquela palavra que
não se diz.
Mas
justo na hora em que o governo Dilma enfrenta um tiroteio cerrado de todos os
lados e grandes turbulências, na semana passada, um raio atingiu em cheio o
quartel da Guarda Presidencial, em Brasília, levando ao hospital 31 militares
feridos, felizmente sem vítimas fatais. E sem que a oposição ou as elites
golpistas pudessem ser responsabilizadas.
A
advertência metafórico-meteorológica parece sob medida para a infalível,
incontestável e incorrigível Dilma, mas também para cada um de nós. Os raios
fulminam a onipotência humana e revelam a nossa fragilidade e precariedade, nos
fazem aceitar que, se não há justiça na natureza, nem no cosmos, nem nos deuses
e religiões, nos resta acreditar que a ideia de fazer justiça é só uma invenção
humana, com todas as suas imprecisões e contradições, como parte do processo
civilizatório.
Diz a
lenda que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, mas há registros de
descargas que atingem o mesmo ponto até mais de duas vezes. Mas, ao contrário
da História, os raios não se repetem como farsa, mas como tragédia, inexorável
e inexplicável. Raios políticos, como metáfora da força do acaso, já caíram
várias vezes no Congresso, na Presidência e no Ministério da Fazenda.
Vítima
constante de raios, como os que mataram Tancredo Neves, Luís Eduardo Magalhães
e Eduardo Campos, o Brasil agora sofre com os raios econômicos semeados pelo
governo Dilma, colhendo tempestades politicas e trovoadas sociais. Não há
nenhuma crise internacional, os Estados Unidos cresceram 4,6% no trimestre, até
a União Europeia e a América Latina cresceram mais do que o Brasil, com menos
inflação. A crise é de quem a criou, a conta é nossa.
Mas,
cuidado, panelas atraem raios.
Nelson Motta, O Globo, 14/3/2015
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