Quem está
acostumado com a elegância fria e contida do vice-presidente Michel Temer
estranhou não só o tom, mas também a forma do pronunciamento, quarta-feira, em
que conclamou um pacto nacional “acima dos partidos, do governo, de toda e
qualquer instituição” e, num ato falho, pregou: “É preciso alguém para
reunificar o País!”
Tenso,
emocionado, até com o cabelo desalinhado, Temer parecia anunciar o fim do mundo
– ou seria o fim do governo Dilma Rousseff? Se é preciso “alguém” para
reunificar o País, é porque os governos do PT dividiram o País e Dilma não tem
poder, aptidão e competência para consertar o estrago. E esse alguém pode muito
bem, até pela lógica e pela Constituição, ser o vice. Enquanto Temer falava em
tom de estadista, um desavisado poderia ironizar: só falta pôr a faixa
presidencial...
A sensação
foi potencializada pelas declarações do chefe da Casa Civil, Aloizio
Mercadante, que inverteu posições com Temer. Enquanto o vice deixou a frieza de
lado, o sempre arrogante e beligerante ministro foi humilde, conciliador e até
bem-humorado ao defender um “pacto suprapartidário” e fazer um afago no
arqui-inimigo PSDB.
Num
ambiente político explosivo como o atual, as interpretações pipocaram em
Brasília. Temer e Mercadante tentavam apenas evitar a “pauta-bomba” na Câmara?
Ou refletiam o desespero do governo? Ou, enfim, tinham recebido a sinalização
de que Dilma jogaria a toalha?
Para
piorar, o presidente do Senado, Renan Calheiros, deixou vazar o jantar entre o
seu PMDB e o PSDB de Aécio Neves, depois encorpado pelo PSDB de José Serra.
Desta vez, foi fácil interpretar: tucanos e peemedebistas já discutem cenários
e inclusive o “day after” de um eventual afastamento de Dilma, seja por que
motivo for, seja de que forma for.
A crise
ganhou contornos mais dramáticos com a derrota acachapante do Planalto na
votação do projeto que vincula salários da AGU e de delegados aos do Supremo –
por emenda constitucional! E explodiu de vez com o Datafolha que confere a
Dilma o amargo troféu de presidente mais impopular desde a redemocratização,
com 8% de aprovação, 71% de reprovação e 66% pró-impeachment.
Diante de
tudo isso, tem-se que Dilma Rousseff não tem sustentação nem dentro (o
Congresso) nem fora (na população) e é incapaz de conter a crise política e
econômica, enquanto a Lava Jato expõe as entranhas do governo Lula a céu
aberto. Os ratos, ops!, os partidos aliados já começam a abandonar o barco,
caso de PDT e PTB (um ministério cada), mas o processo depende mesmo é... do
PMDB. Maior partido do País, ele se comporta como um pêndulo, ora vai para o
PSDB, ora para o PT. Neste momento, move-se claramente para o lado do PSDB.
É aí que
tudo empaca, porque o que impede uma saída negociada é justamente a divisão do
PSDB, particularmente acirrada diante da derrocada da era PT. Ao PMDB e a José
Serra encanta a hipótese da posse de Michel Temer, via decisão do TCU. A
Geraldo Alckmin convém que nada mude e que Dilma vá aos trancos e barrancos até
2018. E a Aécio Neves, que é quem de fato tem a máquina tucana nas mãos, ou
Dilma fica até o fim ou Dilma e Temer caem juntos pela reprovação das contas de
campanha no TSE.
Foi por
isso, e só por isso, que os líderes Cássio Cunha Lima e Carlos Sampaio, ambos
aecistas, correram a declarar ontem que, se Dilma for afastada, o sucessor tem
de ser legitimado pelo voto popular, com novas eleições 90 dias depois e o
presidente da Câmara assumindo o Planalto até lá. Tradução: nada de
apoio à posse de Temer.
Resumo da
ópera: o PMDB já pulou fora do barco do PT, mas ainda não consegue pular no do
PSDB, que navega com vários comandantes, ao sabor de correntes marítimas
conflitantes e mirando diferentes destinos. Sem isso, nem o PMDB nem as
oposições chegam a lugar nenhum. Dilma, com ou sem o Congresso, com ou sem a
opinião pública, vai ficando, ficando, ficando... E a economia vai
implodindo, implodindo, implodindo...
Eliane
Cantanhêde, O Estado de São Paulo, 7/8/2015.
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