O governo
deve ser o primeiro interessado em agir com rapidez, sem desculpas
protelatórias, no sentido de esclarecer a infiltração de informações contra
jornalistas na enciclopédia livre Wikipédia. A manipulação do site, com dados
desabonadores e incorretos, teve origem na rede de computadores do Palácio do
Planalto.
O fato de que as informações foram acrescentadas por alguém em
atividade no poder central agrava a atitude de quem se preocupou em atingir
dois comentaristas econômicos independentes. Nos dois casos, os currículos dos
atingidos receberam comentários sem conexão com a realidade, atribuindo aos
jornalistas análises que nenhum deles produziu. O que está implícito na ação é
a tentativa de atacar quem, por suas abordagens descompromissadas com os
interesses do governo, é considerado inimigo dos governistas.
O
jornalismo tem como bem maior a preservação da sua reputação. Os dois alvos,
Míriam Leitão, colunista de O Globo, e Carlos Alberto Sardenberg, da CBN e da
Rede Globo, construíram carreiras respeitadas pela credibilidade e qualidade de
suas informações. Ambos, assim como muitos outros profissionais da imprensa,
são eventualmente atacados pelos que tentam desqualificar não só seus
trabalhos, mas a capacidade de refletir sobre a realidade brasileira sem
vínculos com o poder ou quaisquer outros interesses.
As acusações acrescentadas
aos seus currículos são denunciadoras do caráter de seus autores. São
empobrecedoras como atitude crítica.
As reações
de entidades do setor, como a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e a
Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), marcam uma
posição firme diante do ocorrido, para que o episódio não seja esquecido em
pouco tempo. É oportuna também a manifestação do procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, no sentido de indicar que cabe ao Ministério Público do Distrito
Federal a investigação do caso. O delito mais visível é o do uso de
equipamentos do serviço estatal para atacar pessoas, em especial críticos do
governo. Trata-se, numa avaliação imediata, de ato a ser enquadrado em infração
disciplinar grave. Mas o ocorrido é mais do que uma afronta a normas
administrativas. Trata-se de uma agressão a princípios básicos da ética e da
moralidade na atividade pública.
O governo
tem a obrigação de determinar a identificação dos responsáveis pela manipulação
da enciclopédia, diante das provas de uso da rede de internet do Planalto. A
liberdade de expressão, assegurada pela Constituição, somente será plenamente
exercida se todos se submeterem às consequências de seus atos. As estruturas de
governo, a serviço do bem comum, não podem ser desfrutadas impunemente por
difamadores.
DIÁRIO CATARINENSE - 10/08/2014
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