Uma
elite de psicopatas sobe ao poder e se cerca de adeptos e militantes que, no
afã de enxergar as coisas como seus chefes mandam, acabam desenvolvendo todos
os sintomas da histeria.
A saúde
mental de uma comunidade pode ser aferida pela dos indivíduos que ela eleva aos
mais altos postos e incumbe de representá-la. O mais breve exame do Brasil sob
esse aspecto leva a conclusões que já ultrapassam a escala do alarmante e se
revelam francamente aterrorizantes.
Já
tivemos um presidente que achava lindo fazer sexo com cabritas, se gabava de
haver tentado estuprar um companheiro de cela – prova de macheza, segundo ele –
e confessava entre risos as mais cínicas mentiras de campanha. É claro que a
tropa dos seus guarda-costas e marqueteiros corria, nessas ocasiões, para dar a
essas declarações o sentido de meras brincadeiras, mas, supondo que o fossem, é
igualmente evidente que pessoas adultas normais não se divertem com gracejos
tão torpes.
Qualquer
que fosse o caso, no entanto, a conduta desse cidadão não sugeria nenhuma
doença mental e sim propriamente uma psicopatia – a deformidade moral profunda
que sufoca a voz da consciência e autoriza o indivíduo a viver de manipulações,
trapaças e crimes sem nunca enxergar nisso nada de anormal.
Já
mencionei, em outros artigos, o livro do psiquiatra Andrew Lobaczewski,
Ponerologia: Psicopatas no Poder (Vide Editorial, 2014), em que uma equipe de
médicos poloneses condensa os resultados de décadas de observação da elite
comunista que dominava o país, e descreve tecnicamente o fenômeno da
“patocracia”, o governo dos psicopatas.
Mas,
como explica o próprio dr. Lobaczewski, quando uma elite de psicopatas sobe ao
poder, ela se cerca de adeptos e militantes que não são psicopatas, mas que, no
afã de enxergar as coisas como seus chefes mandam em vez de aceitar os dados da
realidade, acabam desenvolvendo todos os sintomas da histeria. A histeria é um
comportamento fingido e imitativo, no qual o doente nega o que percebe e sabe,
criando com palavras um mundo fictício cuja credibilidade depende inteiramente
da reiteração de atitudes emocionais exageradas e teatrais.
Um
exemplo, já antigo, esclarecerá isso melhor.
Todo
mundo conhece o deprimente episódio da discussão feia na qual a deputada Maria
do Rosário xingou seu colega Jair Bolsonaro de “estuprador”. Incrédulo, o deputado
perguntou:
-- Agora sou eu o estuprador?
A deputada, fria e pausadamente,
confirmou:
-- É sim.
O
deputado, que não é lá muito famoso pelas boas maneiras, deu-lhe uma resposta
brutalmente sarcástica (“não vou estuprar você porque você não merece”) e a
adversária ameaçou dar-lhe uns tapas, deixando de cumprir o intuito ante a
promessa de um revide, sendo então chamada de “vagabunda” e tendo um dos mais
célebres chiliques da história política nacional.
Está
tudo gravado.
As
circunstâncias que precederam o acontecimento são muito reveladoras. Bolsonaro
tinha apresentado um projeto de lei que previa penas mais severas para os
estupradores, inclusive antecipando o prazo de maioridade penal para que a
punição pudesse alcançar tipos como Roberto Aparecido Alves Cardoso, o
Champinha, um dos estupradores e assassinos mais cruéis que este país já
conheceu.
Maria do
Rosário era contra a antecipação da maioridade e defendia penas mais brandas
para estupradores e assassinos de menos de dezoito anos.
O
projeto do deputado Bolsonaro era aprovado por mais de 90% da população.
Defensora
de uma causa impopular, e cunhada, ela própria, de um estuprador de menores,
Maria do Rosário tinha todos os motivos para ficar com os nervos à flor da pele
quando se discutia estupro e menoridade. Chamar de estuprador o algoz maior dos
estupradores não fazia o menor sentido, evidentemente, exceto como inversão
histérica da situação real.
Do ponto
de vista penal, admitindo-se que ambos os parlamentares tenham cometido
delitos, o da deputada foi bem mais grave. Nosso Código Penal pune com seis
meses a dois anos de detenção o crime de calúnia (imputação falsa de ato
delituoso) e com apenas um a seis meses de detenção o de injúria (ofender a
dignidade e o decoro de alguém). Pior: a lei concede atenuante ao delito de
injúria se é cometido em revide a insulto anterior, e um segundo e maior atenuante
se o revide foi imediato. Os dois atenuantes aplicavam-se à conduta do deputado
Bolsonaro. Em comparação com Maria do Rosário, ele estava praticamente inocente
no episódio.
Bem,
esses são os dados objetivos da situação, mas a reação da esquerda nacional
quase inteira, seguida de perto por toda a grande mídia, foi levantar um
escarcéu dos diabos contra o deputado, chegando a pedir a cassação do seu
mandato e apresentando Maria do Rosário como vítima inocente de uma violência
verbal intolerável.
Por mais
intenso que seja o ódio político que se vota a um inimigo, simplesmente não é
normal inverter de maneira tão flagrante a lógica dos fatos e o seu sentido
jurídico para fazer do agredido o agressor e do revide injurioso, por mais
grosseiro que fosse, um crime mais grave que o de calúnia.
Pior:
todos os que incorreram nessa loucura faziam-no em tom de tão profunda
indignação – alguns chegando até às lágrimas --, que não pareciam, de maneira
alguma, estar mentindo deliberadamente. Ao contrário: a coisa era uma inversão
histérica genuína, característica, indisfarçável. E coletiva.
A
passagem do tempo não parece tê-la curado, mas agravado. Ainda esta semana,
como o deputado Bolsonaro relembrasse o episódio, mostrando não arrepender-se
do que tinha dito a Maria do Rosário, a deputada Jandira Feghali viu nisso,
não, como seria normal, uma prova de falta de educação, mas – pasmem – uma
confissão de estupro. E, aos berros, exigia a cassação do mandato de Bolsonaro,
alegando que “não podemos admitir a presença de um estuprador nesta Casa”. Não
deixa de ser significativo que, nessa mesma semana, uma pesquisa da
Universidade da Califórnia revelasse que a incapacidade de perceber o sarcasmo
pode ser um sintoma de demência.
Porém
ainda mais significativo é que, também na mesma semana, a deputada, lendo uma
frase minha segundo a qual todos deveríamos “atirar à cara dos comunistas, em
público, todo o mal que fizeram”, lançou o alarma: Olavo de Carvalho prega
assassinato de comunistas!
O
histérico não enxerga o que está diante dos seus olhos, mas o que é projetado
na tela da sua imaginação pelo medo e pelo ódio.
OLAVO DE CARVALHO
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