A presidente bolivariana reeleita abriu seu novo
reinado falando em diálogo. Gato escaldado tem medo de água fria: seria este o
mesmo tipo de diálogo oferecido à "Veja"?
Ou às depredações que a militância petista fez à Editora
Abril?
Ou às mentiras usadas contra Marina Silva e Aécio
Neves durante a propaganda política?
Ou às perseguições escondidas a profissionais de
diversas áreas que recusam aceitar a cartilha petista, fazendo com que eles
percam o emprego ou fiquem alijados de concursos e editais?
Sei, muitos ainda negam a ideia de que exista um
processo de destruição da liberdade de pensamento no Brasil. Mas, uma das
razões que fazem este processo ser invisível é porque a maior parte dos
intelectuais, professores, jornalistas, artistas e agentes culturais diversos
concorda com a destruição da liberdade de pensamento no Brasil, uma vez que são
membros da mesma seita bolivariana.
O "marco regulatório da mídia", item do
quarto mandato bolivariano, é justamente o nome fantasia para a destruição da
liberdade de imprensa no país.
Diálogo? Sim, contanto que se aceite a truculência
petista e seus abusos de poder. Deve-se responder a este diálogo com uma
política de secessão. Não institucional (como nos EUA no século 19 entre o norte
e o sul), não se trata de uma chamada à guerra, mas sim uma chamada à
continuidade da polarização política.
A presidente ganhou a eleição dentro das regras e,
portanto, deve ser reconduzida a presidência com soberania plena.
Mas nem por isso ela deve se iludir e pensar que
representa o Brasil como um todo: não, ela representa apenas metade do Brasil.
A outra foi obrigada a aceitá-la.
Precisamos de uma militância de secessão: que os
bolivarianos durmam inseguros com o dia seguinte, porque metade do país já sabe
que eles não são de confiança.
Que fique claro que a batalha foi ganha pelos
bolivarianos, mas, a guerra acabou de começar, e começou bem.
O Brasil está dividido. Esta frase pode ter vários
sentidos. O partido bolivariano venceu de novo, completando em 2018 16 anos no
poder —o que já dá medo a qualquer pessoa minimamente inteligente ou sem má-fé
política.
A divisão do Brasil hoje é fruto inclusive da própria
militância bolivariana que insiste em falar em "nós e eles".
O fato da eleição para presidente ter sido decidida
por alguns poucos votos a favor dos bolivarianos não implica que o lado
derrotado veja a vencedora como sua representante legítima, ainda que legal.
O PT ensinou bem ao Brasil o que significa ódio
político e agora corre o risco de provar do próprio veneno.
Falo de uma secessão simbólica, e que, creio, deve ser
levada mais a sério pela intelligentsia (normalmente a favor do projeto
bolivariano, mesmo que, às vezes, com sotaque e afetação francesa ou alemã).
Os intelectuais não estão nem aí pra corrupção. Seu
novo slogan é "rouba, mas faz o social".
Não, não estou dizendo que aqueles que votaram contra
o projeto bolivariano de domínio totalitário do país devam recusar
institucionalmente o resultado das eleições.
Estou dizendo que devem levar a fundo uma política de
recusa sistemática da lógica de dominação petista.
Os bolivarianos virão com sua "democratização das
mídias", outro nome fantasia pra destruir a autonomia institucional,
demitir gente "inadequada", tornar a mídia confiável aos projetos do
"povo deles" — o único que aceitam. Na verdade, fazer da mídia refém
do movimento MTSM (os "trabalhadores sem mídia").
Esta recusa deve ser levada a cabo nas salas de aula
das escolas de ensino médio (onde professores descaradamente pregavam voto na
candidata petista), nas universidades, nos bares, nos empregos, nas redes
sociais.
Dito de outra forma: a polarização do debate deve
continuar, e se aprofundar. Sem trégua. Do contrário, o PT ficará no poder mil
anos.
Pacto institucional, governabilidade, vida normal
dentro das instituições democráticas, sim.
Mas secessão política cotidiana em todo lugar onde
algum bolivariano quiser acuar quem recusar a cartilha totalitária petista.
Luiz Felipe Pondé
(Pernambucano, filósofo, escritor e
ensaísta, doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de
Tel Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como comportamento
contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, entre
eles, 'Contra um mundo melhor' (Ed. LeYa). Escreve às segundas-feira na Folha de São Paulo).
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