segunda-feira, 23 de junho de 2014

O STF SEM BARBOSA



Não pode passar despercebida a saída do ministro Joaquim Barbosa da relatoria dos processos de execução penal do Mensalão e sua iminente aposentadoria. Ainda que sofra contestações, sua atuação no episódio resgatou a confiança da população brasileira na Justiça. Sua retirada precoce, conjugada com a campanha de descrédito comandada por alas inconformadas do PT e por atritos com advogados de defesa dos condenados, ressuscita a desconfiança de que as chicanas jurídicas para proteger os poderosos voltarão a predominar nos julgamentos. É verdade que o temperamento irascível do ministro contribuiu para litígios desnecessários. Mas a grande questão agora é outra: manterá o Supremo a aura de respeitabilidade reconquistada?

Entre as alegações para o fato de o presidente do STF deixar a relatoria de todas as ações e recursos relacionados ao Mensalão, algumas reforçam a perspectiva de menos rigor tanto na condução do processo quanto nas decisões em geral da Corte máxima daqui para a frente. É o caso da decisão sobre demandas como a do ex-ministro José Dirceu, interessado em trabalhar fora da prisão, e a do ex-presidente do PT José Genoino, que pleiteia prisão domiciliar alegando razões de saúde. O futuro relator, Luis Roberto Barroso, para quem o Mensalão consistiu num "ponto fora da curva", promete encaminhar ao plenário essas questões, em relação às quais o ministro prestes a se aposentar tinha posições muito firmes, das quais não abria mão. E a tendência é de que sejam revistas.

Ao assumir a relatoria do inquérito, Joaquim Barbosa contribuiu em muito para desfazer a imagem de um Supremo incapaz de punir políticos. Até começar a ser derrotado por um plenário já com nova composição, o ministro prestes a deixar a casa impôs um inédito rigor nas penas e nas condenações. O caso do ex-presidente Fernando Collor é exemplar dessa fase menos rigorosa: afastado do cargo em 1992 por denúncias de corrupção, só teve seu julgamento concluído neste ano, duas décadas depois. E foi absolvido por unanimidade.

Enaltecido por uns e criticado por outros pelo rigor na interpretação da lei, Joaquim Barbosa conseguiu mostrar ao Brasil e ao mundo que políticos podem, sim, pagar por seus erros. O risco agora é de que o vazio deixado pela saída antecipada do ministro volte a ser preenchido pela histórica indisposição do Supremo para punir políticos faltosos e, em consequência, por um desgaste inevitável na sua credibilidade.


Diário Catarinense - Florianópolis - 22/6/2014

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